Em 1578, no que talvez tenha sido a Última Cruzada da coroa portuguesa, o rei Dom Sebastião liderou cerca de 20 mil soldados na famosa Batalha de Alcácer-Quibir. O jovem rei português se aliou ao exército do sultão Mulei Maomé para combater o grande exército saadiano liderado pelo sultão Mulei Moluco, que tinha o apoio dos otomanos. A intenção de Dom Sebastião era clara: ampliar os domínios cristãos no norte da África.
Contudo, as areias do deserto foram impiedosas e os portugueses foram aniquilados. Na verdade, a batalha também é conhecida como A Batalha dos Três Reis, porque os dois sultões pereceram, enquanto o rei Dom Sebastião foi dado como desaparecido já que seu corpo jamais foi encontrado.
O desaparecimento de Dom Sebastião gerou uma crise imensa na linha sucessória do trono de Portugal. Além disso, muitos nobres, bispos e arcebispos, enfim a elite governante, participaram da batalha e morreram ou foram feitos prisioneiros. Os marroquinos exigiram uma fortuna pelo resgate dos sobreviventes e gerou uma crise sem precedentes nas finanças, já depauperadas por tudo o que havia sido investido nessa cruzada. O resultado é que o reino ficou à mercê da coroa espanhola, que se aproveitou da situação para anexar o território e criar a União Ibérica.
O povo português entrou em desespero, não só por perder sua liberdade e sua identidade, mas por se tornarem meros servos dos espanhóis. Foi então que surgiu o mito secular do Sebastianismo: muitas pessoas acreditavam que o jovem rei não havia morrido quando desapareceu no norte da África, que ele estaria vivo e aguardando o momento certo para derrotar os espanhóis. Assim, o mito alimentou as esperanças do povo português por um longo tempo: Dom Sebastião retornaria como o Salvador da Pátria e os livraria de todos os males.
Sendo o Brasil uma ex-colônia portuguesa, obviamente que o Sebastianismo chegaria aqui. Se tornou algo tão entranhado em nossa identidade que, até hoje, séculos mais tarde, causa seus estragos. A população brasileira parece viver à espera de um grande salvador imbuído de certa aura mística para resolver todos os seus problemas. É mais fácil e mais simples ignorar a responsabilidade individual por seus fracassos e suas agruras cotidianas enquanto aguarda as próximas eleições e um Dom Sebastião ressurgido para salvar o povo.
Observo vários conhecidos expressando uma fé fervorosa de que basta o candidato deles vencer as eleições e o Brasil será salvo. Não sei se é ingenuidade, não sei se é conveniência, mas sei que parece apenas o Sebastianismo se fazendo presente em pleno século 21. Dom Sebastião jamais voltou para salvar Portugal, até dizem as más línguas que ele simplesmente fugiu porque não valia a pena se sacrificar pelo seu povo. Quanto mais altas forem as expectativas, maior será o tombo.