A quarta-feira (14) representou um marco rodoviário histórico no transporte de passageiros: o dia em que foi apresentado, em Caxias do Sul, o primeiro protótipo de micro-ônibus autônomo da América do Sul. O modelo que não necessita de condutor, desenvolvido pela Marcopolo em parceria com a Lume Robotics, transportou o primeiro grupo de passageiros que não estava envolvido diretamente no projeto em um trajeto dentro do parque fabril de Ana Rech.
Antes de circular em Caxias, os primeiros testes tinham sido feitos em ambiente universitário, já que a startup de mobilidade autônoma que estabeleceu parceria com a Marcopolo está sediada dentro da Universidade Federal do Espírito Santo. Na sequência, o veículo circulou dentro do parque fabril da siderúrgica ArcelorMittal, em Tubarão (ES).
Mas é em Caxias que ocorre o teste mais importante, por ser uma planta fabril com mais de 7 mil pessoas em circulação. E a própria neblina fechada que marcou a quarta-feira serviu para testar ainda mais o micro-ônibus do modelo Volare Attack 8, um veículo de oito toneladas.
Esta colunista teve a oportunidade de estar entre o seleto grupo que embarcou no micro-ônibus autônomo, o que ajudou a entender o tamanho do desafio para desenvolver a tecnologia que, diferentemente de veículos autônomos de carga, tem detalhes ainda maiores, como no caso da frenagem. Afinal de contas, está transportando passageiros.
A aplicação inicial deverá ser dentro de empresas no transporte de fretamento, até por uma questão de regulamentação, já que hoje não há previsão legal para circulação de veículos autônomos nas ruas do país. Mas, a partir do momento que os testes forem concluídos, a Marcopolo já poderá comercializar os ônibus para um mercado bem específico, como explica o CEO, André Vidal Armaganijan:
_ É o que nós enxergamos como a principal aplicação neste momento: trabalhar em ambientes controlados. Tem até uma questão de regulação brasileira. E, no momento, o melhor caminho para a gente promover é o de ambientes fechados, para transporte de pessoas, de funcionários, ou seja, estou falando aqui em fretamento em grandes parques industriais _ aponta o CEO.
O protótipo é resultado de dois anos de desenvolvimento com tecnologia majoritariamente nacional. O veículo tem sensores e câmeras que detectam o trajeto, monitoram o tráfego e também obstáculos, que vão de buracos a pedestres. É a inteligência artificial interpretando os dados e tomando as decisões. Ela é capaz de analisar 20 cenários por segundo. Em ambientes com conexão de internet, é possível trabalhar com uma central de monitoramento à distância.
A tecnologia está no nível quatro de automação, ou seja, no penúltimo antes do grau máximo já estabelecido. Ainda não há previsão de quando estes ônibus serão produzidos em escala e estarão circulando nas ruas. Neste primeiro momento, o veículo funciona com motor a combustão, mas há intenção de se pensar em novos protótipos, inclusive para elétricos.
Os próximos passos incluem levar o micro-ônibus para pista de testes homologadas que possam medir economia de combustível e outros parâmetros necessários para que ele possa ser colocado no mercado. Também está sendo desenvolvido o embarque automatizado.
Os "motoristas" dos testes
Embora o modelo autônomo não necessite de motoristas, para a fase de testes do protótipo, em que muitos ajustes ainda são necessários, o micro-ônibus conta com dois "condutores". Um deles é o que fica na frente do volante, mas que só vai acioná-lo em casos específicos. O outro é o que opera o computador. Os dois "motoristas" estão trabalhando lado a lado há cerca de duas semanas, quando começaram os trabalhos em Caxias. O caxiense Leandro Oliveira da Costa, 33 anos, motorista da empresa Servicarga, foi o primeiro a ver o volante se movendo sozinho. É ele quem aperta o botão, que aciona o comando manual, em caso de necessidade. É ele também que repassa a experiência do usuário para o outro condutor, Diogo Gomes, 26, engenheiro eletrônico da Lume, que faz a operação no computador. Assim, se o veículo acelera bruscamente, freia de mais e tem algum comportamento diferente de acordo com os obstáculos apresentados, é possível ajustar todos os parâmetros.