Quando a caxiense Alethea Heinen Evangelista, 44 anos, foi morar nos Estados Unidos (EUA), assumiu uma nova identidade. O apelido de Allie, no crachá do primeiro emprego no Exterior, como camareira, é o mesmo nome que a executiva adotou para a carreira que construiu em 23 anos. E a levaram a ser a atual presidente do Hard Rock Hotel & Casino Bristol. Recentemente, ela falou sobre a aposta no sonho americano em reunião-almoço da CIC de Caxias do Sul.
— Fiz isso pelo meu pai — revelou a filha do ex-presidente da CIC, Carlos Heinen.
A seguir, Allie, que é formada em Turismo pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), conta um pouco de sua trajetória profissional em grandes redes de hotéis, a partir de 1999, até assumir um dos principais postos da rede Hard Rock no mundo.
O que a levou para os Estados Unidos?
Quando eu fazia o bacharelado na UCS, tive um intercâmbio na Disney em 1998, de quatro meses. Foi quando conheci meu marido. Quando terminei a faculdade, resolvi me mudar. Já são 23 anos que moro aqui. Quando eu estava no segundo grau eu já tinha estudado na Inglaterra para aprender inglês por nove meses. Eu queria explorar o mundo e, por isso, fui fazer carreira de turismo. Mas eu queria morar na Europa, e acabei nos Estados Unidos porque conheci o Fábio Evangelista, um italiano que nasceu aqui (nos EUA). E estamos casados há 21 anos.
Como foi teu início de carreira como estrangeira?
Quando me mudei, morei na casa do meu marido por algum tempo, mas precisava trabalhar e ter a minha própria renda. Foi aí que comecei a trabalhar de camareira. Não tem como chegar em um lugar e ter cargo de gerente. Ninguém está nem aí para o teu certificado. Tive que aprender o estilo americano, o modelo de trabalho. E fui conhecendo as pessoas. Depois eu quis trabalhar na recepção e comecei a perceber que os gerentes valorizavam muito quem tinha disponibilidade de ficar duas horas a mais, de cobrir doente... Como eu estava com muita intenção de construir carreira, eu dizia sim para tudo.
E esses “sins” te levaram para que outros lugares?
Trabalhei na Flórida por vários anos, desde camareira até ser diretora. Em 2006, fiz entrevista para um cassino no estado de Missouri e achei uma indústria muito interessante. Fiquei nove anos por lá e aprendi tudo sobre jogos, caça-níqueis e cassinos. E lá também surgiu a oportunidade de trabalhar com Recursos Humanos (RH). Fiz dois mestrados, em administração de empresas e gerenciamento de RH, que me abriram bastantes portas. Depois fui para a Pensilvânia, Ohio... morei em sete estados diferentes.
E a família te acompanhou?
Meu marido é engenheiro mecânico e trabalha em casa para uma empresa de design de engenharia para produtos fabris. Assim, ele tem a oportunidade de ir comigo, porque tem uma carreira flexível. Temos três cachorros que vão junto. Não temos filhos. Nós dois temos irmãos que nasceram quando éramos adultos e acho que tivemos essa oportunidade de ter crianças em casa.
O que você acha da legalização de jogos de azar no Brasil, já que o projeto agora está sendo discutido no Senado?
A cultura dos jogos tem de ter regras e leis que precisam ser seguidas. O Brasil tem essa fama de não seguir, mas esta é uma indústria muito regulamentada. Se for como nos Estados Unidos, não só vai beneficiar o Brasil, como vai eliminar essas preocupações com lavagem de dinheiro. Porque é um mercado muito estruturado para prevenir isso. É muito difícil fazer isso nos EUA, porque temos ferramentas muito boas para evitar desvios. A grande diferença é que aqui os impostos são pagos por Estado, onde o cassino é construído. No Brasil, pode ser mais complicado, porque para onde vai o dinheiro dos cassinos? Se não tiver clareza para onde vão os investimentos resultantes dessa indústria, talvez não se percebam os benefícios para o local onde o cassino é operado.
Temos visto várias executivas da Serra com destaque internacional. Que movimento é esse?
Tenho orgulho de representar o Brasil no Exterior. Os EUA mudaram bastante em termos de abrir portas para a diversidade. A indústria dos jogos é predominantemente masculina. Muitas vezes, eu era a única mulher em muitas reuniões e jantares de negócios. Antes do Hard Rock, em uma empresa onde trabalhei e que tinha 43 cassinos, eu era uma das três mulheres que gerenciavam esses negócios. Algumas empresas se destacam mais que outras, tanto que a Hard Rock recebeu um prêmio da Forbs a reconhecendo como um bom local para mulheres trabalharem. Eu estou montando um time para o projeto que estou liderando e contratando muita gente de Cuba, México, Honduras, África do Sul... Estou tentando ser inclusiva nas minhas escolhas. Claro que sempre procurando as melhores pessoas, mas acho que podemos ter mais opiniões e experiências. Com mais diversidade, melhor.
E o que vem pela frente de investimentos da rede Hard Rock, inclusive para o Brasil?
Eu trabalho para a Hard Rock internacional que faz as franquias e operam alguns café e hotéis pelo mundo. Abrimos um hotel em Budapeste na semana passada. Estamos construindo um hotel novo em Nova York. E estamos investindo mais e mais na área de cassinos. O projeto que está em construção, e eu estou comandando em Bristol no estado da Virgínia, deve ter uma parte aberta em abril e ele deverá ser concluído no verão dos EUA. São 400 milhões de dólares em investimento e duas mil pessoas contratadas. O meu gerente, Jon Lucas, é responsável por todos os cassinos, hotéis e cafés do mundo da marca. E no Brasil ele tem oito projetos, sendo que um deles está em construção em Fortaleza. Recentemente, foi aberto um centro de eventos em Florianópolis. Tem projeto de expansão para hotel em Gramado. E há projetos de hotel-cassino, como para São Paulo e Foz do Iguaçu, mas tudo dependendo do que vai ocorrer com a lei de jogos no Brasil.