A aprovação de um pacote de benefícios para os vereadores de Caxias do Sul nesta quinta-feira (14) foi um péssimo encerramento de ano para o Legislativo. Pela forma e pelo conteúdo do que foi votado, trata-se de um grande equívoco, com alta dose de oportunismo e falta de conexão com a realidade da população.
Para situar sobre o que estamos falando: em uma das seis sessões extraordinárias realizadas nesta quinta, e que foram necessárias devido ao acúmulo de projetos a serem votados, foi aprovado o Projeto de Lei 232/2023, que estabelece a remuneração dos ocupantes da futura legislatura, a partir de 1º de janeiro de 2025. A proposta, votada já durante a noite, prevê um reajuste salarial de 27,9%, o que levará os vencimentos para R$ 15.801,63, além da criação de um 13º salário para os 23 parlamentares. O projeto traz também um subsídio extra para o presidente da Câmara, que passará a receber R$ 18.742,91.
A primeira grande questão que se levanta é a forma com que tudo foi conduzido. A proposta passou absolutamente sem discussão, já que nenhum vereador pediu a palavra para debater o assunto. E não havia nenhuma informação prévia de que este projeto seria votado agora, quase anônimo, no meio de diversas outras questões importantes para a cidade. Acabou passando por unanimidade, com votos de todos os partidos com assento na Câmara, e sem nenhuma possibilidade de contraditório pela sociedade. Uma postura lamentável, com zero transparência e totalmente oportunista, para evitar a pressão popular que acontece quando este tipo de ideia entra em pauta.
O outro ponto é o mérito (ou a falta de) da proposta em si. Embora não tenham falado em plenário, já se sabe quais são as justificativas que serão usadas: vereadores fazem um trabalho importante, que ocupa bastante tempo deles; a Câmara de Caxias tem uma estrutura reduzida em comparação com outras; e o que está sendo repassado é a defasagem dos salários, em virtude da inflação em anos anteriores.
Estes argumentos até podem ter um fundo de verdade, mas caem por terra quando se vê a realidade da população. Hoje, sem o reajuste, o salário líquido de um vereador caxiense fica em torno de R$ 9 mil. Pergunto: quantos cidadãos atualmente têm acesso a uma remuneração como essa? Óbvio que muito poucos, com o agravante de que a população não tem o poder de decidir quanto vai ganhar.
Um parlamentar pode e deve ganhar bem, mas sem excessos, tendo o bom senso de não viver em um mundo paralelo. Os salários dos vereadores até podem ter se desvalorizado nos últimos tempos, mas jamais poderá se comparar isso com a perda de poder aquisitivo da população em geral, hoje endividada e sufocada para conseguir o mínimo da sobrevivência básica. Não faltarão aqueles que classificarão essa opinião como demagógica. Eu prefiro pensar que está mais conectada com a realidade das pessoas, com a vida real.
Outra distorção de argumento é dizer que a Câmara de Caxias gasta pouco em comparação com outras. Se é mesmo verdade, que bom! Isso então deveria seguir assim e jamais ser usado como argumento para buscar equiparação com legislativos que não servem de exemplo para nada.
Relembro aqui que sempre defendi o papel que a Câmara de Vereadores exerce. Em todos os momentos tenho me colocado contra aqueles que não reconhecem a importância que os parlamentos exercem no nosso regime democrático, e entendo que, embora com pontos a melhorar, o Legislativo da cidade tem uma trajetória de bons serviços. No entanto, uma decisão como a desta quinta depõe contra esse histórico, dando munição a quem minimiza e despreza a política.
Ah, e não adianta culpar a imprensa pela má repercussão, viu?! Quem prestou este desserviço à imagem do parlamento foram os próprios vereadores. Que fique claro e registrado.