Constantemente ouço o desejo de ser diferente, de se reinventar, de transformar-se. Todos em algum momento da vida desejamos mudar. Mudar de vida, de história, de corpo, de cabelo, de casamento, de vontades. Mudar de ares, de cidade, de país, de família. Quem nunca? Nessas horas, quando ouço isso, penso que antes de tudo é preciso, primeiro, encapsular em um casulo. O casulo é o transcendental de todo ser vivo. Não são apenas alguns insetos que carecem de um tempo voltado para dentro, para si mesmos, nós também. Precisamos de um tempo para aceitar que está na hora de trocar de pele. Precisamos aceitar que às vezes precisamos mudar de pele. Também passamos por metamorfoses ao longo da vida. E, de quando em quando, percebemos a necessidade de voltarmos a nós mesmos para depois seguirmos.
Algumas pessoas são mais resistentes às mudanças, como se mudar fosse fazer com que perdêssemos nossa identidade. Gosto de casulos e dessa imagem psíquica de que também temos os nossos tempos-casulo para viver, pois um casulo é, antes de tudo, a prova de que nossa vida não pode estar atrelada a apenas uma identidade fixa. Por mais que isso assuste, basta olhar-se no espelho, não somos mais iguais a quando tínhamos 10 anos, 20 anos, 40 anos. Na verdade, somos inclusive diferentes de ontem.
Quando entramos para dentro de um casulo descobrimos que estamos habitando um tempo que divide nosso corpo psíquico em dois. Há um de antes, que quer mudar, que precisa mudar, que quer parar de ser do modo como é, pois tem sofrido e feito outros ao redor sofrer. E um outro que surge cheio de novas possibilidades, futuros, desejos. Recolher-se em si mesmo é permitir com que a natureza aplique sua sabedoria e nos ajude em nossas metamorfoses. Quando estamos dentro de nós mesmos nos damos conta de que a vida não pode ser feita de exclusões, porque é olhando para si mesmo que percebemos a multiplicidade que somos ou podemos ser.
O casulo é a prova de que precisamos nos reinventar. Precisamos aprender a ser nós mesmos, mas de outra forma. Às vezes a vida nos arrebata. Alguém querido morre, um casamento termina, uma amizade se rompe, o trabalho se encerra. Quando isso acontece percebemos que não podemos estar presos a essas situações como se fossem a única possibilidade de vida. Nossa vida não pode, ou pelo menos não deveria, se limitar a uma geometria de adaptação, mas é preciso que possamos perceber que reinventar-se é fundamental, sempre, e não apenas quando algo de ruim nos visita.
Por isso, quando escuto sobre o desejo de mudar, tento na medida do possível, trabalhar a ideia de que é preciso tempo para se ter consciência de si, mas ter consciência de si não é necessariamente chegar a um lugar confortável em que podemos nos reconhecer. Penso que seja justamente outra coisa. Ter consciência de si é dar-se conta de que há forças que nos atravessam de modo irremediável e por mais que não queiramos mudar, ficar no mesmo ponto, torna-se impossível. É só a partir dessa constatação, por vezes dolorosa, que as asas começam a nascer.