Há dias tenho pensado sobre o correr do tempo. Talvez há tempos. Esse tempo que nos atravessa feito ventania sem nos dar espaço para parar um pouco. Todos, tenho certeza, já desejamos poder segurar as horas, prender os minutos. Um desejo de espichar momentos, pois nossa memória não é lá muito elástica. Quem nunca desejou conseguir prolongar o último abraço, o último adeus, o último sorriso. Afinal, só nos damos conta de que o tempo corre quando ele cruza por nós e nos deixa para trás. Há talvez a necessidade de uma compreensão na inversão dos fatos. Explico: não somos nós que vivemos a vida, mas a vida que vive através de nós. Havia vida antes de estarmos aqui. Haverá vida depois de não estarmos mais aqui. A vida segue e seguirá seu curso. Daí nos damos conta de que ser quem somos no correr do tempo é uma fatalidade. Poderíamos ser diferente do que somos? Não sei, não sei. Sei que somos um amontoadinho, assim no minúsculo mesmo, de horas finitas. Eis a marca do possível em nós. Por isso, penso também, ser quem somos não é uma finalidade, como se em algum momento tivéssemos de apresentar resultados. Não somos máquinas.
Enquanto escrevo essa crônica ouço o riso de uma criança que me chega pela janela. É domingo, fim da tarde e acabo por sorrir também. Estamos vivendo o instante. Talvez a única instância possível de se viver de fato. O passado além de ter passado, fica aos poucos, borrado, sem contorno. E quanto mais a infância fica distante, mais o tempo passou por nós. Mais nos afastamos do começo. Do futuro nada sabemos. Mas quanto mais corremos mais nos aproximamos dele e no fim dele, há o fim.
Há alguns meses tomei coragem e comecei a nadar. Pela manhã, bem cedo, tomo coragem, coloco o maiô, a touca, o óculos e me jogo na piscina. Demorei a abrir os olhos, mesmo usando óculos, um medo infantil. Muitos medos. Agora, lá embaixo, no silêncio, tudo fica num verde água. Puro instante. Redescubro minha respiração. Descubro que não sei respirar. Percebo que passei uma vida inteira respirando num ritmo que não é o meu. Quantas e quantas vezes respiramos na velocidade do outro e as angústias, os desafetos, as necessidades, as raivas, as ansiedades do outro. Mergulho e penso no meu pai. Semana passada fez um ano que ele morreu. Meu pai que tinha um coração fraco e água nos pulmões. Já vivia mergulhado em si sem conseguir respirar direito, e pior, não sabia nadar. Dou braçadas na água como quem deseja abraçar o próprio tempo. Descubro que preciso me redescobrir, compreender e aceitar meu ritmo que é diferente do da instrutora, que é diferente do das pessoas que fazem a aula na mesma hora. Nadar traz uma consciência das coisas. Quando respiramos percebemos que estamos vivos e que tudo é instante. Aí o gerúndio fica perfeitamente belo e aceitável, pois só se vive, vivendo, porque a vida quer nos viver. Sejamos uma boa casa para ela e respiremos o agora, que é de fato, o único instante que temos.