E de repente uma coisa dentro de nós ganha corpo. Se remexe. Ocupa espaço. Assusta. Há dentro de todos nós um outro que às vezes acorda faminto. Sem tino ou juízo, sem paciência, meio criança, ainda embrutecido, sem educação. Uma raiva canta seu primeiro grito. O corpo acompanha a toada. Tensão. Então é preciso voltar a respirar. Abrir o punho já feito. Enjaular. Toda fera-humana carrega um assombro. Já temos feridas o suficiente para cuidar. Não há cultura ou história que dê conta das fraturas existentes em nosso corpo social. E no entanto, é preciso que tenhamos coragem de fechar as portas para as certezas, quase sempre incorretas. Descolonizar. Mas para isso, é preciso antes termos a humildade de juntar os pedaços de si e do nós. Fissurar a tensão. Atravessar medos. Apressar o passo. Tracionar a poesia. Voltar a acreditar. É preciso que a raiva se transforme em versos, que a voz de um grito vire canto e que juntos sonhemos um outro tempo possível.
Vida
Notícia
Há tensão
Que a inteligência aliada à maciez da ternura polinize nossos sonhos mais profundos
Adriana Antunes
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