Há 150 dias, a Câmara de Vereadores de Marau, no norte do Estado, enfrenta uma impasse que ultrapassou os limites do Legislativo e vem dividindo a comunidade, ganhando repercussão em nível nacional. O processo instaurado pela Comissão de Ética contra o vereador Laércio Zancan (PSB) por quebra de decoro parlamentar teve seu início em outubro do ano passado e se arrasta até hoje. De acordo com o vereador Anderson Rodegheri (PP), presidente da Comissão de Ética, o processo partiu de quatro denúncias recebidas pela Mesa Diretora da Câmara, envolvendo bolsonaristas que bloqueavam as rodovias em protesto ao resultado das eleições gerais, integrantes do movimento Lugar de Criança é na Escola, a vereadora Elisabete Alban (PP) e uma cidadã que alegou ter sido difamada pelo vereador. Inclusive, em função de um pronunciamento do vereador que se manifestou contrário aos bloqueios das rodovias, ele recebeu ameaças de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro e teve que sair escoltado de uma das sessões da Câmara pela tropa de choque da BM. O caso chegou até a Comissão Estadual de Direitos Humanos e à secretaria nacional dos Direitos da Pessoas LGBTQIA+, do Ministério dos Direitos Humanos, onde o vereador relatou estar sofrendo perseguição política e preconceito por fazer parte da população LGBTQIA+.
Vitória parcial
Na sessão da última segunda-feira, após a realização de oitivas, quando foram ouvidas testemunhas de defesa e de acusação, a Comissão apresentou o seu relatório pedindo a perda de mandato do vereador, baseado no art.21 que dispõe sobre o Código de Ética Parlamentar. Esta foi a primeira vez na história do legislativo marauense que a Comissão de Ética foi acionada. De acordo com o relatório, o vereador Laércio, “praticou atos ofensivos à imagem da Câmara e a reputação dos vereadores que é obrigação de todos os vereadores defender”. Marcada a princípio para esta segunda-feira, a votação do decreto de perda de mandato pelo plenário da Câmara, acabou sendo adiada, após a defesa do vereador ter obtido na Justiça uma liminar que suspende a tramitação do projeto de resolução e que garante a manutenção do mandato do vereador até o julgamento do mérito da ação.
Alegações
Segundo o advogado Bruno Weber do Amaral, que faz parte da defesa do vereador, o processo possui uma série de ilegalidades, a principal delas, é de não ter oportunizado a ampla defesa do vereador dentro do prazo legal. Alega ainda o decurso do prazo processual e a parcialidade dos integrantes da Comissão. Já o vereador Anderson Rodegheri afirmou à esta coluna, que todo o rito procedimental foi rigorosamente cumprido e que foi garantida a ampla defesa. Sobre o fato dos vereadores da Comissão de Ética serem os mesmos da Comissão de Constituição e Justiça que emitiram parecer favorável ao relatório, Rodegheri explica que foi “uma coincidência” e que apesar da Câmara ter nove vereadores, “não são todos que são atuantes no trabalho das comissões”...
E o PSB?
O caso vem sendo acompanhando de perto pela direção estadual do PSB não só pela gravidade da situação enfrentada por um vereador do partido, mas também pelo fato do vereador Vaguinho Daré, também do PSB, ter se posicionado na tribuna contra o seu colega de bancada, e, inclusive, fazer parte da Comissão de Ética que pede a cassação do mandato. Em contato com esta coluna, o presidente do PSB estadual, Mário Bruck, lembra que o diretório estadual recomendou a expulsão do vereador do partido, mas que o diretório municipal não seguiu a orientação. Segundo ele, a instância municipal tem que ser respeitada, mas não descarta uma atitude mais drástica, caso o posicionamento do vereador Vaguinho seja pela cassação do mandato do colega. Para o presidente do PSB-RS, o vereador Laércio vem sofrendo uma perseguição político-ideológica sem precedentes e questiona: “será que se ele não fosse homossexual, estaria sofrendo os mesmos ataques? Será que não é esta questão que irrita os mais conservadores?” Segundo Mário Bruck, a manifestação de Laércio na tribuna, quando condenou os bloqueios nas estradas, faz parte de uma prerrogativa parlamentar, e o cerceamento à liberdade de opinião de um vereador pode abrir um grave precedente. Para ele, o episódio em Marau representa um atentado à democracia.
Equívoco na votação
O posicionamento do deputado Giovani Cherini (PL) no painel de votação do requerimento de urgência do projeto do marco temporal não causou surpresa apenas à esta coluna, mas gerou reações indignadas de milhares de eleitores do deputado, que não entenderam o voto contrário de Cherini, que se posicionou junto com a bancada do governo. Pois segundo a assessoria do deputado, houve um equívoco no momento da votação, mas posteriormente ele registrou o seu voto por escrito, se posicionando favorável ao projeto que aprovou o regime de urgência. O PL 490 deve ser votado nesta terça-feira, antes da matéria ser julgada pelo STF.