Ele circula entre bares, restaurantes e casas noturnas de Passo Fundo, vendendo rosas e girassóis para o público, que vai desde casais apaixonados, grupos de amigos, até desconhecidos que resolvem surpreender alguém.
Seu Arlindo Nunes, 69 anos, conhece o mundo das rosas como a palma da sua mão. Ele começou a trabalhar com produção e cultivo de roseiras em 1976, nas horas de folga, quando ingressou como ajudante na pequena empresa de um amigo e por volta de 1993, iniciou a venda direta na noite passo-fundense. Nestes 29 anos, foram milhares de rosas comercializadas.
O senhor grisalho, de pouca estatura mas muita simpatia, tem muita história para contar, afinal, são 47 anos desde o primeiro contato com as rosas. Essas quase cinco décadas lhe trouxeram um vasto conhecimento sobre a força e a fragilidade das flores, que ele acredita ter relação direta com a vida, tão delicada.
— Trabalhar com rosas é um trabalho de ciência, exige observar sempre, cuidar. A flor é a ciência da vida. Quando ofereço flores aos clientes falo sobre o significado que elas têm para mim, envolvendo carinho, gratidão, amor, renovação e prosperidade. Tudo isso se dá através da fragilidade da flor, isso a diferencia das demais espécies. Na minha concepção, se não existisse a flor não haveria sobrevivência. O mundo sem flores é apagado, sem graça.
Da experiência que teve com produção de roseiras, Arlindo traz todo o aprendizado que teve com um amigo, que o ensinou e incentivou a prática do cultivo.
— Meu amigo, Adão Pimentel, me ensinou tudo o que sabia sobre rosas, pagou minha carteira de motorista, me ajudou muito. Um dia ele jogou fora uma dúzia de roseiras e levei para casa para plantar. Em 1979 fiquei trabalhando exclusivamente com a produção. Em 1984 saí da empresa e segui trabalhando com minha produção nas horas de folga, aliando com outros empregos formais, afinal a vida nunca foi fácil. Aos poucos as coisas foram se ajeitando e eu fui me apaixonando cada vez mais pelas rosas.
De 1985 até 1996 Arlindo teve sua produção particular de rosas, unindo trabalhos em áreas como serviços gerais, metalurgia, vigilância, frigorífico, mas nunca deixou as flores.
Em 1994 saiu de um emprego de vigilante, época em um de filhos, então com 16 anos, morreu atropelado quando andava de bicicleta.
— A partir daí comecei a fazer a venda de flores, eu e minha esposa chegamos até decorar casamentos, fazer buquês para noivas, mas o mercado foi ficando cada vez mais difícil para os pequenos produtores. Fizemos isso até 1996 e depois comecei a comprar de fornecedores e vender, o que faço até hoje.
Arlindo registrou uma microempresa, mas no período não havia muito incentivo para pequenos empreendedores. Em 2006 deu baixa na empresa e seguiu o trabalho.
Família
Arlindo nasceu em Tunas, então distrito do município de Soledade, em 10 de junho de 1953. Casou em 1975 e teve quatro filhos, três meninos e uma menina. Um dos meninos morreu atropelado com 16 anos de idade.
— Quando viemos para Passo Fundo nosso filho mais velho era recém-nascido. Viemos em busca de uma vida melhor, porque aqui tinham grandes fábricas e frigoríficos, a oportunidade de emprego era grande.
Em 1984 comprou um terreno no bairro São José e construiu sua casa com as próprias mãos.
— As duas janelas da minha casa eu comprei numa loja do centro e fui buscar de bicicleta. Tudo foi feito aos poucos, com esforço, juntando dinheiro e fazendo por minha conta cada peça da casa.
Hoje Arlindo convive com a família, segue casado e fala com orgulho das duas bisnetas, que são a alegria de seus dias.
Muita história para contar
Desde quando começou a venda direta, nos anos 1990, Arlindo já presenciou situações e pitorescas e surpreendentes.
— Uma noite eu fui oferecer flores para um rapaz que estava com três moças. Ele comprou uma rosa para cada uma delas e deu um beijo no rosto. Na namorada, o beijo durou pelo menos meia hora, foi um beijo de novela.
Em outra oportunidade, um jovem comprou todas as rosas que Arlindo tinha na cesta. Ele presentou a namorada com oito lindas rosas vermelhas e ganhou um beijo demorado.
— Uma outra vez na Gare eu vendi 12 rosas para um homem. Ele deu uma rosa para a namorada e uma para cada mulher que estava nas mesas ao redor. Foi um gesto de muita gentileza. Deixou várias meninas felizes.
Ele também tem histórias diferentes.
— Uma moça gostou de um rapaz que estava no balcão na frente de um bar. Me chamou, comprou uma rosa e pediu que eu entregasse para o moço de jaqueta caramelo. Quando cheguei perto tinha três rapazes disputando a rosa, mas ela já tinha dono (rs) e entreguei para o rapaz indicado.
Outra vez, na rua Independência, uma das mais movimentadas na noite de Passo Fundo, um casal estava circulando e a jovem largou a mão do namorado e saltou na frente rapidamente.
— Ela virou para o namorado e alcançou a flor. Falei pra ele se considerar honrado, pois recebeu uma rosa de presente, porque homem não é de ferro. O que falta é as pessoas entenderem que um gesto de carinho custa quase nada e significa muito. Faço isso com uma grande sensação de bem estar, me sinto feliz e acredito que as pessoas que compram se sentem felizes também. O sorriso no rosto de uma mulher que recebe uma rosa não tem preço. O importante é o gesto de se dar uma flor porque ela representa carinho, amor, gratidão.
Arlindo está esperando o cálculo da aposentadoria, que já encaminhou junto a um advogado. Mesmo assim disse que vai seguir por muitos anos ainda vendendo flores, pela necessidade e pelo prazer de ver o sorriso no rosto de quem as recebe.
GZH Passo Fundo
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