Seja no semáforo, nas paradas de ônibus ou nas marquises de lojas do comércio, está mais comum encontrar pessoas em situação de rua em Passo Fundo. Atualmente, cerca de 70 pessoas se encontram nesta situação, segundo a secretaria de Cidadania e Assistência Social do município (Semcas), além das que estão somente de passagem.
O secretário da Semcas, Saul Spinelli, estima que 80% das pessoas que vivem nessa condição vêm de outros municípios do Rio Grande do Sul, estados e até mesmo países, sobretudo com a presença de imigrantes.
— A sensação de aumento existe. Houve um número maior de pessoas em situação de rua que vêm de fora. Alguns estão na rua, logo depois não estão. Alguns são internados, depois voltam. Outros vão para suas famílias, não dá certo e retornam. Tem muita rotatividade — explica o secretário.
Desde 2019, o número de pessoas em situação de rua em Passo Fundo não baixa de 175, conforme dados da Secretaria de Cidadania e Assistência Social. No ano passado, 178 pessoas nessa situação foram registradas no município.
O maior número dos últimos cinco anos foi em 2019, antes da pandemia de Covid-19, com 198 pessoas em situação de rua. Com a pandemia, a Semcas não conseguiu medir efetivamente os casos.
Para a coordenadora geral da Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo, Luciane Zanella, esse aumento de pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social, sem garantia de direitos fundamentais básicos, se dá pela falta de políticas públicas.
— As políticas públicas voltadas a amparar a população que está em situação de rua, são insuficientes, e, a maioria dos atendimentos a este público, não estão voltados ao enfrentamento da causa problema, e acabam suprindo somente as necessidades básicas. Entendo que, o surgimento e o aumento da população em situação de rua é reflexo direto da exclusão social, pois não há um investimento social consistente, tanto a nível municipal, estadual e nacional - afirma Luciane.
No Brasil, um estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que a população em situação de rua cresceu em 38% entre 2019 e 2022, com um total de 281,4 mil pessoas em todo país.
Rede de proteção
Passo Fundo possui um dos 16 centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) do Rio Grande do Sul. Em 2022, foram mais de 3,7 mil atendimentos individualizados realizados no local, além de 1,1 mil abordagens de pessoas em situação de rua.
Dentre os serviços prestados pelo centro, estão inclusos a Casa de Passagem, o Centro de Referência 24h, as rotas de abordagem e o ambulatório móvel. A cada 15 dias, são realizadas ações de ronda de abordagem nas ruas com acompanhamento de assistentes sociais, psicólogo e médico para atendimento, se necessário.
Crescem os atendimentos na Casa de Passagem
Um dos serviços de apoio prestados pelo município às pessoas em situação de rua é a Casa de Passagem Madre Teresa de Calcutá. O espaço abriga até 30 pessoas em situação de rua, migração, ausência de residência e desabrigo por abandono.
Em 2022, o local registrou um crescimento 58,4% no número de atendimentos. Foram 1,5 mil pessoas atendidas, enquanto que em 2021 haviam sido 947. O crescimento é ainda mais expressivo quando se trata de pernoites: 92,5%. No ano passado 7,7 mil pessoas pernoitaram na Casa, já em 2021, foram 4 mil pessoas. Em se tratando de refeições, foram servidas 36 mil no ano passado, ou seja, 44% a mais se comparado ao ano anterior.
— Esses atendimentos giram nas pessoas que chegam em Passo Fundo, procuram emprego, ou como no caso dos baianos [que vieram para Passo Fundo após fugirem de Bento Gonçalves onde eram submetidos à situação de trabalho análogo à escravidão], que vêm de passagem, também tem quem faça uma ponte para outra cidade e essas pessoas escolhem Passo Fundo, justamente por termos essa rede de proteção — pontua Spinelli.
Os diagnósticos mais comuns das pessoas em situação de rua são problemas mentais e psicossociais. Para ser atendido na Casa de Passagem, é necessário o cumprimento de algumas regras, entre elas a não utilização de drogas nem consumo de bebidas alcoólicas. Em 2022, foram 95 interações químicas de pessoas em situação de rua.
— Quando os problemas são de ordem neurológica, de dependência química ou de álcool, nós precisamos do profissional da saúde para encaminhar. E isso fez com que, no ano passado, tivéssemos 95 pessoas internadas por este motivo — pontua Spinelli.
Mas, para sanar o problema que vem aumentando cada vez mais, é preciso pensar mais a fundo e ir além da retirada compulsória dessas pessoas das ruas, como observa a coordenadora da CDHPF.
— Não se garantem os direitos humanos dos moradores em situação de rua retirando ele ou ela, compulsoriamente da rua, ou seja, deve-se investir na política pública de atendimento, de abordagem e acompanhamento de cada um e cada uma de maneira individualizada e de acordo com suas peculiaridades. É de fundamental importância, que a rede de atendimento proporcione o acolhimento humanizado, e que tenha profissionais em quantidade suficiente para prestar o atendimento necessário — finaliza Luciane.