Na segunda colocação do grupo A da Divisão de Acesso, com seis pontos, o União Frederiquense, de Frederico Westphalen, conta com jogadores que se reencontraram no norte do Estado após passarem por momentos de tensão no conflito entre Ucrânia e Rússia, no início de 2022. Até mesmo um atleta ucraniano faz parte do elenco que disputa a competição.
Atacante do União, Matheus Gonçalves, o "Fogo", de 20 anos, é um dos cinco atletas da equipe que deixaram a Ucrânia durante a guerra. Era madrugada de quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022, quando o brasileiro sentiu um tremor em Tarasivka, na Ucrânia.
O estrondo sonoro fez com que seus colegas de quarto também acordassem no alojamento do clube Ukrainian Christian Sport Academy (UCSA), que disputa a quarta divisão ucraniana. Eram os ataques russos na capital ucraniana Kiev, a 15 quilômetros de distância, no conflito do continente europeu.
— Foi aí que percebemos que a guerra estava acontecendo. A gente (jogadores) ficou paralisado, sem entender nada. Eram bombas nos lugares, explosão nos quartéis da Ucrânia. A gente só ouvia um barulho muito forte que acordou todo mundo — lembra o atleta.
Junto de outros jogadores, Fogo contou com o suporte da equipe e do seu empresário para deixar a Ucrânia. Para sair do país, precisou ir até a fronteira com a Polônia. No trajeto, percorreu cerca de 50 quilômetros a pé, além de buscar caronas nas rodovias. No caminho, se deparou com centenas de veículos com famílias que desejavam sair do país e com barreiras policiais.
— Nós (jogadores) decidimos ir a pé, conseguimos carona, fomos andando até a fronteira. Foram dois dias andando a pé. Depois que conseguimos passar a fronteira, voltamos de avião da Polônia até o Brasil. Agora, estamos bem, conseguimos sair de lá. A gente via canhão passando por nós, soldados nas florestas. A gente nunca imaginou passar por essa situação — acrescenta Fogo.
Ucraniano não desiste do sonho
Antes de chegar a Frederico Westphalen, Fogo atuou também em Imbituba, no litoral catarinense. Mas foi no União que o atacante reencontrou o goleiro ucraniano Danylo Liutyi, de 18 anos, com quem foi companheiro de time na Ucrânia.
Embora os destinos tenham se cruzado novamente, Liutyi teve um caminho diferente de Fogo. O goleiro deixou Kiev, onde morava, e se refugiou na Polônia. Por ser menor de idade, na época, com 17 anos, o goleiro não foi chamado para a guerra. Após um mês na Polônia, Liutyi se mudou para Madrid, na Espanha, onde permaneceu em um abrigo da Cruz Vermelha.
— Foi terrível, um horror... (estar no meio do conflito) era cinco horas da madrugada quando acordei por causa da explosão. A decisão de sair foi difícil, porque queríamos ficar lá, mas também queríamos sair, então finalmente decidimos sair — lembra o ucraniano.
Em terra espanhola, com mais tranquilidade, ele pôde retomar o que é o seu sonho: ser jogador de futebol. Antes de receber o convite para jogar no Brasil, o goleiro teve passagem pelo Club Deportivo San Roque.
— Meu pai sempre me disse: se você tem um sonho, tem que seguir até o fim. Fiquei com isso na cabeça e vou seguir até o fim. Vou trabalhar muito, porque minha filosofia é 10% de talento e 90% de trabalho, trabalho duro — pontua.
Longe da família e com o sonho em mente, o goleiro do União Frederiquense relata que a adaptação no Brasil não é fácil, mas o desejo por treinar e jogar é mais forte.
— É a minha primeira vez no Brasil. Não é fácil se adaptar. Saí da Ucrânia com um casaco, documentos e dinheiro. Deixei tudo lá, família, amigos, professores, porque eu queria terminar a minha educação lá. Mas acabou tudo com a guerra, inclusive o nosso campeonato. Em Madrid, de forma online, consegui finalizar o estudo. O meu sonho é jogar futebol, então, minha ideia futuramente é voltar para jogar futebol lá (Espanha) — completa o goleiro, que almeja atuar pelo Real Madrid.
Além do goleiro ucraniano, o União conta com mais oito estrangeiros no elenco, de diferentes países: Uruguai, Paraguai, França e Inglaterra. No início da Divisão de Acesso, o clube dispunha de um atleta da Palestina também, mas que foi liberado para resolver questões pessoais no país de origem.
GZH Passo Fundo
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