Mesmo com uma estiagem menos severa em comparação ao ano anterior, o que ao fim levou a uma safra de grãos maior, 2023 esteve longe de ser um ano de plena recuperação para a economia gaúcha. O PIB do Estado subiu de forma tímida. Apenas 1,7%, após tombo de 5,1% em 2022. Foi também um período desafiador para a indústria gaúcha por suas características e fatores macroeconômicos, como uma taxa Selic que esteve mais da metade do exercício no nível sufocante de 13,75% ao ano.
Foram adversidades que impactaram a renda dos gaúchos, como mostrou reportagem de Rafael Vigna publicada na superedição de ZH. No país, o rendimento médio real subiu 3,25% em 2023, a segunda maior alta em uma década. No Estado, os ganhos de todos os tipos de trabalhos murcharam 1%. Os dados são do IBGE, que também apurou o rendimento domiciliar per capita. Nesse indicador, que inclui transferências de programas sociais, na média nacional a elevação foi de 16,5%, enquanto no Rio Grande do Sul o acréscimo foi inferior, de 10,4%.
O cenário ideal teria uma maior disciplina fiscal para que existam condições sustentáveis de queda do juro
Além da falta de chuva para a safra de verão, o Estado foi castigado por outros eventos climáticos extremos, como as enxurradas que atingiram o Vale do Taquari. As fábricas da região também foram afetadas, assim como todo o tecido econômico local, de pequenos empreendedores urbanos a proprietários rurais.
Como a tendência é de fenômenos ligados ao clima cada vez mais acentuados e frequentes, reforça-se a importância da prevenção. Não é algo apenas ligado à agricultura, em especial com o aumento da área irrigada. E isso que a produção primária repercute em todos os demais setores – indústria, serviços e comércio. Mas a própria construção e a escolha de locais para empreendimentos e obras de infraestrutura devem, cada vez mais, levar em conta a necessidade de se precaver de efeitos de temporais violentos e de ter uma engenharia e uma arquitetura voltadas à resiliência. Na infraestrutura, a preocupação não se resume a estradas e pontes, se estende às redes de energia. Ficar dias sem acessos ou luz não significa apenas transtornos, mas também prejuízos.
Em relação à agropecuária, outro fator que afetou o Estado no ano passado foi o preço dos produtos. O custo para formar as lavouras subiu por efeitos da guerra na Ucrânia, mas os valores pagos aos produtores despencaram na comparação com 2022. Assim, renda e margens caíram. Os agricultores do restante do país ao menos foram beneficiados por uma safra recorde.
Deve-se lembrar também que boa parte da indústria gaúcha é vinculada ao agronegócio. Os clientes estão espalhados por todo o território nacional. Cotações agrícolas em baixa moderam o apetite do produtor em investir. Se o juro estiver alto, o ímpeto é ainda menor. Em relação às fábricas do Estado, convém registrar outras particularidades. O Rio Grande do Sul tem um perfil mais voltado a bens de capital, segmento prejudicado pelo recuo dos investimentos no país. Além disso, no Estado praticamente inexiste indústria extrativa, como petróleo e minérios, que fez a diferença no desempenho do Brasil em 2023. Conforme o IBGE, a indústria cresceu 1,6% no país no ano passado. Aqui, recuou 4%, de acordo com o Departamento de Economia e Estatística (DEE) do Estado. O desempenho díspar, por óbvio, se reflete no ganho dos trabalhadores.
A reação da renda no Estado, portanto, depende de múltiplos fatores. Em termos estruturais, além da aposta na educação, em setores florescentes como a inovação digital e na criação de um ambiente de negócios amigável, o que está nas mãos dos gaúchos, mas com resultados a longo prazo, é um melhor planejamento para impactos climáticos. Porém, também há fatores incontroláveis, como os preços das commodities agrícolas. Em relação ao quadro macroeconômico do país, o cenário ideal teria uma maior disciplina fiscal para que existam condições sustentáveis de queda do juro. Isso beneficiaria a indústria e também os demais setores. Mais atividade significa mais renda.