Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Recentemente, Daniel Scola escreveu um texto destacando cenários de desgraça oriundos do vício em jogo. Concordo e gostaria de pontuar outro aspecto crítico neste contexto: considerar apostas um investimento.
Uma vez que posso apostar R$ 10 e sair com R$ 40, só pode ser um bom investimento, não? Não. Ser eventualmente rentável não significa que é investimento. Apostas (esportivas ou qualquer outra) não são investimento! Investimento é uma aplicação de recursos no presente com a expectativa de retorno ao longo do tempo que o compense pelo tempo que ficou sem este dinheiro, pela inflação do período e pelo risco que tomou. Estes pontos até parecem fazer sentido no mercado de apostas, mas não fazem.
Do ponto de vista financeiro, aposta não se caracteriza como investimento tradicional porque lhe falta, para começar, ativo de base: quem aposta não compra nada de concreto que possa, diante de uma eventual queda, reverter valor em outro momento, por exemplo. Já quem investe costuma aplicar o dinheiro em algo que, por mais volátil e arriscado que seja, é um ativo ou está ligado a um (cota de fundos, ações, títulos etc.).
Claro que no mercado financeiro deve haver controle das emoções para se tomar decisões racionais e ótimas. No caso das apostas, no entanto, isso beira o impossível
Outro ponto que diferencia aposta de investimento são os fundamentos conjunturais, especialmente econômicos, sob os quais se assentam decisões de aplicação e expectativa de comportamento dos ativos relacionados. Por mais sofisticados que sejam os modelos de previsão de resultados esportivos, por exemplo, o nível do imponderável é significativamente maior.
Minha última questão diz respeito ao envolvimento emocional como determinante de decisões. Claro que no mercado financeiro deve haver controle das emoções para se tomar decisões racionais e ótimas. No caso das apostas, no entanto, isso beira o impossível. Segundo estudo de 2013, publicado na Frontiers in Behavioral Neuroscience, a motivação para apostas está mais associada à imprevisibilidade do retorno do que ao retorno propriamente dito – o que explica o potencial de gerar vício.
Um investimento arriscado nunca será uma aposta em função dos ativos de base e dos elementos de conjuntura que o norteiam. Na aposta, não há conjuntura a ser avaliada, pois não há negócio, não há atividade financeira ou produtiva. Por mais sedutor que pareça estimar desfechos, são apenas prognósticos estatísticos incapazes de oferecer um mínimo de segurança em um cenário no qual o imponderável é a regra.