Alfredo Fedrizzi, conselheiro e consultor
Os graves acontecimentos climáticos no mundo – um deles, avassalador, no RS – mostram que o desrespeito com a natureza chegou ao seu limite. Para aqueles que pensam que proteger a natureza é bobagem, as provas são incontestáveis e as consequências estão na vida de cada um de nós. Sabemos que o problema climático não é uma responsabilidade só dos brasileiros. Muitos países no mundo se desenvolveram à custa do desmatamento. Sendo um país mais jovem, podemos aprender com os erros dos outros. Para o Brasil, que tem o agronegócio como maior fonte de exportação, cuidar do principal regulador de chuvas, a Amazônia, é vital. A ciência já provou que isso é essencial. Acabei de ler o livro Arrabalde – Em Busca da Amazônia, de João Moreira Salles. Por seis meses, ele “mergulhou” nos lugares mais complicados da região. Conversou com quem vive na floresta, com os fazendeiros, estudiosos e autoridades locais.
O livro mostra que o Brasil patrocina, há décadas, a destruição desvairada da floresta ao estimular a ocupação sem projeto. A floresta já foi chamada de “terra sem gente”, desconhecendo que, quando os europeus chegaram ao Brasil no século 16, a região já era habitada por 10 milhões de povos originários. Quem imigrou, queria substituir a floresta. “Quando eu cheguei, aqui não tinha nada” é um comentário frequente, como se aquele imenso potencial que produz 20% da água doce do planeta e abriga 20% de todas as formas vivas conhecidas do planeta não fosse nada.
Precisamos cuidar do principal regulador de chuvas do Brasil
Lá, hoje, muitos madeireiros, garimpeiros e fazendeiros agem na informalidade. Só 10% dos desmatamentos se tornaram atividade econômica produtiva. O resto são terras públicas invadidas, desmatadas, que viraram pastagens “regularizadas” de qualquer forma e vendidas, resultando em abandonos. Cerca de 22% da floresta já foi destruída. Com o Estado ausente, a criminalidade tomou conta. E muitos produtos não são aceitos no Exterior por virem de áreas desmatadas. Quem produz de forma correta é quem mais sofre. Todos os dias a Amazônia lança na atmosfera, via transpiração das árvores, uma quantidade maior de água do que a do Rio Amazonas. É chuva que cairá Brasil afora. Os “rios voadores” vão para o Sul e o Sudeste e são essenciais para os agricultores brasileiros. A diversidade biológica é a chave da preservação do mundo. Estima-se que existam 30 mil espécies de plantas, das quais vêm os princípios ativos dos remédios. O Brasil pode se tornar um dos centros mundiais da biodiversidade tropical, referência global para a agricultura de baixo carbono, produtos florestais, novos materiais extraídos da natureza, engenharia baseada nas moléculas que curam e embelezam. Ela nos oferece a possibilidade de sermos o que jamais fomos: a maior potência mundial de sustentabilidade climática, preservando o que restou e ajudando a floresta na sua regeneração. A grande oportunidade de mostrar ao mundo que também aprendemos com eles o que não fazer. E que respeitar o planeta é o caminho. A escolha é nossa.
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No último artigo, sobre o PCC, cometi um erro. O Marcola continua preso e não está morto.