Por Fábio Bernardi, sócio-diretor da HOC
Eu queria elencar aqui todos os problemas do Brasil, mas a Dione Kuhn, editora-chefe deste jornal, não permitiu que eu utilizasse todas as páginas de hoje e de amanhã. Então, decidi falar de apenas um, que tem me incomodado ultimamente: a incapacidade que o brasileiro tem de trocar ideias. Somos ótimos em discutir, atirar, confrontar, torpedear e apedrejar ideias, mas péssimos em trocá-las, em ceder a minha e ficar com a sua, ou mesmo, simplesmente, concordar com o outro. Entramos em qualquer conversa com o princípio de que dela sairemos com o outro vencido pela razão, pela insistência ou pelo cansaço. Somos gauleses irredutíveis na nossa Gália mental, e já no início da conversa, não temos um interlocutor, e sim um adversário.
A polarização não é só política, é cada vez mais um traço da nossa vida
Parece que não sabemos mudar de opinião, preferimos mudar de assunto, e alguns, até de amigo. Como se perder a razão fosse perder tudo. Como se estar errado fosse estar morto. Como se concordar com o outro fosse uma rendição vergonhosa. Para que isso não ocorra muitos acabam se tornando fanáticos de uma ideia só. Aliás, o pensador francês Émile-Auguste Chartier já dizia que nada é mais perigoso do que uma ideia quando se tem apenas uma. Parecer ser o caso do brasileiro em geral, que confunde refletir com negar o que se pensa.
Tenho um amigo que respeito muito intelectualmente e que é contra a política de cotas em universidades públicas. Outro, com quem gosto de passar horas conversando, é a favor das cotas. Com cada um, debato e aprendo, sabendo que o conhecimento assim como o amor são as únicas coisas que quanto mais se divide, mais se tem. E meus dois amigos conseguem conviver, debater, trocar ideias, ainda que não mudem de opinião. Afinal, como seres humanos, respeitamos a razão, mas gostamos mesmo é das nossas paixões. Por isso é tão difícil nos desapegar do que acreditamos. Um humorista já disse certa vez que é fácil concordar com aquilo que ele mesmo fala.
A polarização não é só política, é cada vez mais um traço da nossa vida. Qualquer assunto pode ser explosivo, estamos todos na mesma trincheira ao lado dos que pensam como nós, tratando os que discordam como inimigos a serem abatidos. Mas é como diz aquele pensador francês ali de cima: quem quer a guerra já está em guerra consigo mesmo.
Hoje em dia, se quer ficar em paz, fique quieto.