Por Fábio Bernardi, sócio-diretor da HOC
Um dos principais problemas do mundo é que o bom senso não é bem distribuído. E, para complicar, muitos ainda o confundem com a lógica. Nas questões mais polêmicas, a mistura entre bom senso e lógica gera confusões interpretativas perigosas. Exemplo banal: o bom senso nos diz que homens e mulheres na mesma posição devem ter salários iguais. No entanto, a lógica nos diz que, em muitos casos, isso ainda não é viável. Por quê? Ora, porque, para que isso aconteça, alguém precisaria financiar generosamente o bom senso a fundo perdido. Neymar e Debinha (sucessora da Marta), por exemplo, executam a mesma função: ambos jogam futebol com a camisa 10 da Seleção Brasileira.
de quem é a culpa? Do mercado, de quem vende e de quem compra e, sinto informar, sua também. Porque o mercado somos nós
O primeiro ganha muito mais do que a segunda. Não é uma questão de bom senso, é uma questão de lógica. Neymar atrai mais público, mais patrocinadores, mais audiência e mais interesse da mídia. Com isso, vende mais produtos, gera mais atenção de outros segmentos, cria mais desejo pelas marcas que patrocina e se torna ídolo de crianças e jovens. E acaba atraindo ainda mais audiência e interesse, girando a roda novamente. A Copa do Mundo feminina começa mês que vem, tomara que ela me desminta, mas hoje o futebol masculino atrai mais público do que o feminino, e o ecossistema inteiro gira a favor do Neymar e contra a Debinha. E é desse ecossistema que vem o financiamento que propicia que ele ganhe mais. Não é (só) machismo, é lógica. E é fácil comprovar isso: basta trocar o nome de Neymar por Gisele Bündchen. Percebe? O modelo masculino mais bem pago do mundo ganhava um quarto do que a Gisele ganhava no auge, talvez menos. Aqui tampouco é feminismo ou falta de bom senso: é lógica. O ecossistema inteiro da moda gira ao redor e em favor das mulheres. Por isso, elas atraem mais público, interesse, audiência, marcas e cifrões. E existem vários exemplos como esses em vários tipos de indústrias e ecossistemas diferentes. O que não impede que, em muitos casos, esse desequilíbrio financeiro histórico a favor dos homens seja vergonhoso – e que tenhamos que agir com bom senso para equilibrá-lo cada vez mais daqui para frente.
E de quem é a culpa? Do mercado, de quem vende e de quem compra e, sinto informar, sua também. Porque o mercado somos nós. Nós, que preferimos ver um jogo do Neymar e não da Marta. Nós, que debatemos o Djokovic e não a Iga Swiatek, ou que adoramos o Guga Kuerten e nos esquecemos da Maria Ester Bueno, embora ela tenha ganhado muito mais. Nós, que ainda damos audiência para concursos como Miss Universo. Nós, que damos mais espaço para os homens de negócios do que para as mulheres de negócios. Nós, que esquecemos que consumo também é um ato político e uma visão de mundo. Nós, que alimentamos essa máquina que tem muita lógica e pouco bom senso. E que adoramos confundi-los na hora de argumentar a nosso favor.