Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Suponha que você tivesse guardado R$ 1 mil por ano, em uma gaveta, nos últimos três anos. O valor de cada ano está em um envelope diferente. Hoje, você teria R$ 3 mil. Porém, considerando a inflação, para que o primeiro envelope de R$ 1 mil pudesse continuar comprando a mesma coisa que no ano em que o guardou na gaveta, teria de haver dentro dele cerca de R$ 1,2 mil. O segundo envelope teria de ter R$ 1,1 mil e o último, de um ano atrás, R$ 1,05 mil. Ou seja, seu esforço de reserva foi prejudicado pelo fato de que seu capital não rendeu nada.
Distribuir a renda pessoal no tempo (no longo prazo) é a base de uma vida financeira saudável
A educação financeira serve para que as pessoas desenvolvam esta compreensão de que a gaveta não é o melhor lugar para se reservar dinheiro. Segundo a OCDE, a educação financeira, em resumo, deve auxiliar as pessoas a compreender produtos, conceitos e riscos financeiros e desenvolver habilidades para fazer escolhas conscientes em relação ao seu dinheiro. Estes elementos fazem parte do contexto do planejamento financeiro individual e familiar.
Por muito tempo, porém, havia confusão entre educação financeira e matemática financeira. Saber como funcionam juros simples e compostos é uma ferramenta fundamental, claro, para entender por que o dinheiro não pode ficar na gaveta. Ainda assim, a maneira como as pessoas lidam com o dinheiro tem muitas outras dimensões. Hoje, a educação financeira tem avançado e preenchido uma lacuna importante: como se faz para juntar aqueles R$ 1 mil dentro do envelope?
Planejamento financeiro vai muito além do juro composto. Almejar preencher um envelope com R$ 1 mil depende, para começo de conversa, de escolher o que deixar de fazer com este dinheiro no presente. Distribuir a renda pessoal no tempo (no longo prazo) é a base de uma vida financeira saudável.
Segundo uma pesquisa do PoderData, de 2022, 57% dos entrevistados no país teriam R$ 200 para uma emergência – o restante não teria (32%) ou não sabia responder (11%). Ainda que se tratando de uma quantia modesta, apenas pouco mais da metade dos entrevistados afirmou dispor dela. Não ter reserva de emergência é um sinal consistente da ausência de planejamento financeiro.
Ter capacidade de se planejar financeiramente é parte do exercício da cidadania, pois exime as pessoas do aperto inesperado, do superendividamento, da falta de confiança no futuro. A educação financeira, neste contexto, quando construída a partir dos alicerces do planejamento, é indispensável.
Estes esforços de pesquisa acontecem com intuito de se entender se estamos vivendo ou não uma boa vida. E isso seria insumo para avaliar se o que estamos fazendo do ponto de vista de gestão social está adequado. Os governos estão trabalhando para que as pessoas sejam mais felizes? O mundo está ficando mais feliz?
Acontece que felicidade é um conceito tecnicamente complicado como balizador de política pública. E isso se deve ao fato de ele ser multifacetado, de modo que é difícil estabelecer as razões causais para seu resultado. Sim, precisamos de medidas de desenvolvimento que sejam mais amplas e efetivas do que o PIB. Felicidade pode ser um elemento adicional interessante. Mas penso que o que temos hoje ainda está longe de algo mais definitivo.