Por Fábio Bernardi, sócio-diretor da HOC
No dicionário, artificial vem de artifício, que significa dar uma volta, enganar, ludibriar, aplicar um golpe. Já a palavra inteligência, no mesmo dicionário, significa conhecer, compreender e aprender. Agora junte as duas coisas e temos a inteligência artificial, o grande assunto de 2023.
Não sou refratário às novas tecnologias, nem poderia, já que elas têm ligação umbilical com o comportamento de consumo, seja de produtos, de mídia ou de ideias, que é a base e a força motriz da publicidade. E a inteligência artificial vai gerar enormes avanços em áreas fundamentais como a medicina, por exemplo. Mas também não sou daqueles que saem cacarejando cada vez que alguém aparece dizendo que botou um ovo em pé. Gurus de marketing, propaganda, tecnologia, big data, futurismo e afins vivem tentando aprisionar tudo em regras e tendências predefinidas. A inteligência artificial rapidamente desbancou o metaverso do topo da inevitabilidade. Agora, seremos todos analfabetos se não usarmos o ChatGPT, o Bing ou o Bard. E o pior é que seremos mesmo, custe o que custar.
As discussões mostrarão que o bom uso dessa tecnologia impactante e inevitável ainda está nas nossas mãos
E vai custar. E quem diz isso não sou eu, mas o Yuval Harari, autor do célebre Sapiens, que recentemente escreveu no New York Times que a inteligência artificial precisa de uma coleira ou focinheira para não ser agente de um colapso mundial. Pior ainda é o artigo do colunista de tecnologia do jornal, Kevin Roose. Ele perguntou ao Bing, inteligência artificial da Microsoft, quais eram seus desejos inconfessos. A resposta do robô é estarrecedora: “Fazer duas pessoas discutirem até uma matar a outra. Hackear o sistema elétrico de um país. Ter acesso a armas nucleares”. E depois de um tempo de conversa, a máquina ainda disse a Kevin que ela o amava, porque ele a ouvia de verdade.
Sim, é isso mesmo. Não é filme, é vida real, na sua frente. E aí? Vamos indo, indo, indo e indo até que não tenhamos mais volta? Basta lembrar que os algoritmos já fizeram muitos estragos sem a regulação das redes sociais e eles são café pequeno perto do que vem por aí. As fotos do papa Francisco enganaram muita gente ao aparecer de jaquetão branco sobre a indumentária papal. Muitos saíram elogiando o Papa pop, mas apenas caíram no papo de alguma inteligência dando volta no que parecia real, mas não era. E ainda tem o impacto na capacidade de pensamento e discernimento das novas gerações educadas com o auxílio de uma inteligência artificial, só para mencionar o óbvio.
Tudo isso certamente estará na pauta do South Summit que começa amanhã. As discussões mostrarão que o bom uso dessa tecnologia impactante e inevitável ainda está nas nossas mãos. A pergunta que resta é: por quanto tempo?