Uma sociedade não é verdadeiramente democrática sem uma Justiça forte, independente e atuante. Por isso, é preocupante a situação enfrentada desde o começo da pandemia pelo Judiciário gaúcho. O primeiro impacto, uma imposição dos cuidados necessários à prevenção da covid-19, foi o fechamento dos foros e a suspensão dos prazos processuais. Quando, já neste ano, a economia e os serviços públicos ensaiavam um tímido retorno à normalidade possível, um ataque hacker de grandes proporções derrubou os sistemas que servem a magistrados, advogados, promotores, defensores e partes litigantes em todo o Rio Grande do Sul. Agora, quando o Tribunal de Justiça (TJ-RS) recuperava o fôlego, outro sobressalto, desta vez no banco de dados, gera novos transtornos aos milhões de cidadãos que dependem de decisões judiciais pendentes.
É imperioso investigar profundamente as causas que levaram a esta situação e buscar, sem medir esforços, a punição dos responsáveis
O quadro é tão preocupante, que duas das maiores empresas de informática do mundo, a Dell e Oracle, não haviam encontrado resposta ou mesmo um diagnóstico preliminar depois de vários dias de instabilidade nos sistemas. O tamanho do problema é assombroso: cálculos da seção gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS) apontam para mais de 2 milhões de processos parados há meses, gerando prejuízos gigantescos para cidadãos e empresas. É natural que, diante de uma pandemia que já matou mais de 540 mil brasileiros e dos holofotes voltados para disputas de poder em Brasília, o iminente colapso do Judiciário gaúcho não mereça o destaque que teria em tempos menos turbulentos.
A dimensão sem precedente dessa crise levou o presidente do TJ-RS, desembargador Voltaire de Lima Moraes, a classificá-la como a mais grave da história do poder no Estado. Essa avaliação, transparente e responsável, deve servir como um alerta, imprescindível não apenas para a Justiça, mas para todas as instituições, sejam elas públicas ou privadas, cada vez mais dependentes de sistemas informatizados. Foi-se o tempo em que investir maciçamente na segurança digital era uma opção. Hoje, o funcionamento dos computadores e de seus programas é fator de estabilidade institucional, democrática e econômica.
É imperioso, conforme prometeu o desembargador Voltaire de Lima Moraes, investigar profundamente as causas que levaram a esta situação e buscar, sem medir esforços, a punição dos responsáveis. Ao mesmo tempo, porém, cabe compreender que esse não é um problema que diz respeito apenas à Justiça, e sim a cada um e a todos os gaúchos. Quando um dos pilares do Estado democrático de direito é atingido de forma tão contundente, é preciso mobilização e união para superar o momento e, com os aprendizados, pavimentar o caminho para um futuro no qual a Justiça gaúcha, que sempre foi referência nacional, recupere o seu vigor e a sua vitalidade.