É estranho um país em que acaba demitido um ministro da Saúde com altos índices de aprovação de seu trabalho e justo em meio a uma das maiores crises sanitárias já enfrentadas pelo mundo. Pois este é o Brasil governado por Jair Bolsonaro, que ontem dispensou Luiz Henrique Mandetta, um colaborador que até o final do ano passado era um dos mais discretos da Esplanada e, da noite para o dia, chegou aos holofotes por ser a voz e o rosto a dar confiança e segurança aos brasileiros diante da pandemia do novo coronavírus. Lamentável ainda a saída de uma equipe afinada e que mostrou competência ao combater a covid-19, prestar com clareza as mais importantes informações à população e sempre seguir as melhores práticas científicas na batalha para debelar a enfermidade que assusta o planeta.
Em um momento-chave e de emergência, quando o Brasil registra quase 2 mil mortes pelo coronavírus e, sabe-se, está longe do pico do número de vítimas fatais, substituir uma condução serena e racional é uma temeridade. Assombra ainda que as razões que motivaram a saída de Mandetta estejam ligadas a questiúnculas como ciúme pela atenção que o ministro recebeu, a diligência republicana a Estados governados por pretensos inimigos políticos do presidente, a resistência a adotar medidas sem amparo científico, o incômodo às aglomerações criadas por Bolsonaro e o correto ceticismo com um medicamento sem eficácia comprovada. Tudo irreparável aos olhos do conhecimento sanitário e da melhor governança pública.
Mas esta, agora, é uma página virada nesta triste passagem da história do Brasil. Espera-se do novo ministro e de sua equipe, acima de nomes, que permaneçam sendo norteados pela racionalidade, pelo bom senso e pelo respeito à ciência, sem se dobrar a achismos ou caprichos irresponsáveis. São atributos indispensáveis, ainda mais devido à gravidade da situação e à necessidade de arregaçar as mangas e tomar medidas rápidas, quando ainda toma pé das informações disponíveis. Para o bem do país, espera-se que o novo titular da pasta, Nelson Teich, tenha ao menos apoio do Planalto, e não seja sabotado em seu trabalho, como ocorreu com Mandetta.
Teich, oncologista reconhecido e que vinha defendendo o isolamento horizontal, tem um nome a zelar e, em suas mãos, está o destino de muitos brasileiros. Em suas primeiras palavras, sinalizou ontem que não dará uma guinada brusca na política do ministério, o que é um bom começo. A sua delicada missão será preparar uma transição, assim que possível e seguro, para uma flexibilização que libere mais atividades econômicas. Deseja-se que encontre meios para fazer a testagem em massa que defende. Não pode ser esperada outra postura do novo ministro que não o diálogo produtivo com o Congresso e com governadores e prefeitos, independentemente das cores partidárias, para um trabalho coordenado que tenha como único objetivo vencer o inimigo comum. Embora não seja político, Teich certamente terá mais tato e habilidade do que o seu novo chefe para construir consensos e a união que hoje falta, em benefício da saúde e dos brasileiros.