O governo federal acabou por demonstrar maturidade e responsabilidade ao decidir, planejar e executar a operação de retirada dos cidadãos brasileiros que estavam em Wuhan, cidade chinesa onde o novo coronavírus, que assusta o mundo, apareceu e se alastrou com grande velocidade. A organização do resgate até a chegada e a preparação do hotel de trânsito localizado dentro da base da Força Aérea Brasileira (FAB) em Anápolis (GO) também foram exemplares. Mostram que o Brasil tem competência para colocar em prática ações complexas e sensíveis, que poderiam parecer possíveis unicamente a países de Primeiro Mundo.
O governo titubeou, mas acordou para o fato de que, muito acima de qualquer dificuldade logística, estão os sentimentos de solidariedade e união que formam uma nação
O próprio governo e o presidente Jair Bolsonaro titubearam em um primeiro momento, mas acordaram para o fato de que, muito acima de qualquer dificuldade logística da retirada, estão os sentimentos de solidariedade e união que formam uma nação, o que deve incluir esforços do Estado brasileiro para colocar a salvo compatriotas em situação de risco. É elogiável, da mesma forma, a decisão de levar junto cidadãos poloneses, algo possível pela escala das aeronaves em Varsóvia. Mas, certamente, se os aviões tivessem maior capacidade, o Brasil também encontraria uma maneira de fazer o mesmo com latino-americanos que enfrentam o mesmo drama na cidade chinesa.
Apesar de ter prevalecido o bom senso, não é possível deixar passar sem reprovação lamentáveis posturas de resistência à escolha do local para a quarentena dos brasileiros. Como o caso do presidente da Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg), Sandro Mabel, que demonstrou no mínimo uma grande falta de sensibilidade e empatia ao criticar a acolhida em Anápolis. Felizmente, preponderou a visão de outros agentes, como a do governador goiano, Ronaldo Caiado, que se colocou firme na defesa da ideia de receber os brasileiros na cidade, após a Aeronáutica colocar de pé, em poucos dias, uma das mais delicadas missões de resgate da história recente do país. Créditos ainda para o Itamaraty, em particular aos três diplomatas da embaixada em Pequim que, provando desprendimento, foram até Wuhan e ajudaram a operacionalizar o resgate, fazendo jus à melhor tradição do Instituto Rio Branco.
O país tem sido dividido pela política e pela radicalização. Esse breve interlúdio no sectarismo proporcionado pela reação a uma tragédia deve servir de exemplo para comprovar que, acima de tudo, a população brasileira e grande parte do seu aparato público são formados por cidadãos de todas as tendências que desejam e trabalham pelo melhor para a nação.