Por José Luiz de Araújo Aymay, advogado e mestre em Direito Público
Caro leitor, imaginemos que em 2020 a sua remuneração seja superior ao teto constitucional. Ou seja, algo acima de R$ 39 mil por mês. Pense que você receberá o referido numerário, terá casa própria e ainda será “premiado” com auxílio-moradia.
Por aqui, cabe recordar que o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, quando atuava na condição de juiz em Curitiba, recebia o aludido auxílio. Os noticiários da época informavam que Moro morava numa casa a somente três quilômetros do prédio da Justiça Federal do Paraná, onde trabalhou desde 2003, e teria recebido o tal benefício-moradia a partir de 2004. Ocorre que, para muitos, Moro pode tudo, pois condenou Lula.
Retomando o núcleo do texto, questiono como seria a sua vida se, além do gorducho salário e do auxílio-moradia, você pudesse desfrutar de 60 dias de férias remuneradas no ano? E, na eventualidade de ser negligente no exercício da atividade, ser penalizado com aposentadoria compulsória, consegue imaginar?
Complicado. Num país onde a miséria atinge 13,2 milhões de pessoas, de que forma atribuir justiça a essas “garantias” dos magistrados?
Mas, acreditem, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) propuseram ação no STF para impedir o avanço civilizatório do juiz das garantias, previsto no conhecido “pacote anticrime” e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro em 24 de dezembro de 2019.
Uma das alegações da AMB é risível. Afirmou que “[...] não há como dar execução à lei do juiz das garantias sem provocar aumento de despesas”. Ora, será que algum cidadão, conhecedor dos “penduricalhos” recebidos pelos magistrados, acredita que eles estão preocupados com o aumento de despesas?
Não obstante, há juristas propagando que o Estado não reúne condições econômicas para implementar o juiz das garantias. Então, se o impedimento realmente é econômico, por que não cortar as benesses dos nossos juízes?
Compreendo a relação entre direito e economia, e que nem sempre é possível estabelecer convergência entre o ter que fazer e o poder fazer. Porém, quando tratamos das questões de Estado, nenhuma análise poderá colocar o interesse de classes acima dos fins sociais e do bem comum. E, há muito, Francesco Carnelutti, em As Misérias do Processo Penal, e Franz Kafka, em O Processo, denunciavam, entre outros, as angústias dos investigados. Portanto, devemos reconhecer a importância do juiz das garantias na legitimação do procedimento investigativo, para evitar abuso de direito e ilegalidades, fazendo valer a Constituição.