Por Fábio Bernardi, que trabalhou na campanha de Eduardo Leite e é sócio-diretor de criação da Morya
O Nobel de economia Daniel Kahneman criou o termo "falácia narrativa", que significa pensarmos o futuro como se ele fosse uma simples extrapolação linear do passado – um hábito responsável por sermos "pegos de surpresa" com movimentos que, olhando em retrospecto, seriam óbvios.
Pois o Rio Grande do Sul vive em falácia narrativa há décadas. Vivemos imaginando que sairemos de uma situação ruim apenas porque já tivemos um passado que não era assim. Vimos governos se repetirem e, ao mesmo tempo, se repetindo: maquiando orçamentos, vendendo patrimônio, sacando depósitos judiciais, não pagando precatórios e conseguindo liminar para não pagar a dívida com a União, só para ficar nos recursos mais recentes para arranjar dinheiro. E, ainda assim, o salário é parcelado há 44 meses. E, enquanto isso, os demais poderes vivem no seu Rio Grande particular, onde só para si é que nunca houve crise, só para si é que sempre sobrou dinheiro, só para si é que nunca se parcelou o salário. Não bastasse isso, mais de uma vez os deputados tiveram a chance de minimizar a situação ao negar aumentos como o dado pelo ex-governador Tarso Genro (para ser pago no governo seguinte, deixando evidente a falta de dinheiro e de vergonha) ou como na vez em que desaprovaram a mudança no Plano de Carreira do Magistério que eles mesmos tinham aprovado meses antes.
Como conseguimos, de um jeito ou de outro, chegar vivos até aqui – ainda que assumindo o sentido literal do termo farrapos – a maioria dos gaúchos, mesmo os bem informados, parece imaginar que continuaremos assim indefinidamente, driblando a sorte e a falta de dinheiro com pirotecnias orçamentárias, excesso de diagnóstico, frases feitas e discursos populistas de oposição.
Todos nós vivemos hoje naquele futuro que nunca chegaria. Só que alguns de nós estão sentados nas cadeiras que podem acabar de vez com esta miragem que vivemos nos últimos anos. Ao que parece, apesar de consumir boa parte de seu capital político, o atual governador entendeu o que significa sentar na cadeira em que está, onde deve pensar mais em nós do que nele mesmo. Quem senta na cadeira de deputado deveria agir assim também, lembrando que não existe sobrevivência política em um estado morto financeiramente.
Fazer a Reforma Estrutural do Estado é uma decisão difícil. Mas dos covardes a história não fala. E no futuro não vai adiantar dizer que foram pegos de surpresa.