Vencida, ao que parece, a onda mais aguda de críticas internacionais ao presidente Jair Bolsonaro pelas bravatas e omissão na defesa da floresta amazônica, é recomendável que, a partir de agora, o governo aprenda a deixar de brigar com os fatos. O primeiro e maior aprendizado deste desastre de imagem é que os incêndios, mesmo que na média dos últimos 15 anos, foram potencializados e escandalizaram o mundo pela postura de negação e terceirização de responsabilidades do Planalto.
Outro ensinamento: a dimensão da cadeira presidencial deveria refrear a tentação do presidente de guiar seu cardápio de decisões e declarações por desinformação, radicalismo e teorias conspiratórias que poluem as redes sociais de seguidores fanáticos, substituindo-as pela informação técnica e científica. No fundo, os bolsonaristas mais radicais prestam um serviço a adversários que tanto combatem ao atribuir um rótulo esquerdista à causa ambiental, quando, na realidade, a defesa do desenvolvimento sustentável é a face mais moderna do capitalismo. Basta lembrar que a ideia de preservacionismo nasceu nos Estados Unidos, com a criação do primeiro parque nacional, o de Yellowstone, em 1872. No século passado, a Europa capitalista tomou a frente da defesa do ambiente, enquanto a então União Soviética e a China comunista desprezavam protocolos ambientais e se convertiam em vilões da poluição.
Além de ameaçar o agronegócio, o despreparo governamental para questões ambientais pode atingir a meta do governo Bolsonaro de aumentar significativamente o fluxo turístico externo
A imagem do Brasil que liderava diversas frentes ambientais, entre as quais a de produção de energia renovável, ruiu em poucas semanas pela incúria do presidente, mas desde sexta-feira à noite, quando mudou o tom e adotou atitudes concretas para enfrentar o problema das queimadas, o governo Bolsonaro dá sinais de que começa a compreender o impacto de suas ações ou da falta delas. A par da descabida menção do presidente francês, Emmanuel Macron, a uma absurda "internacionalização" da Amazônia, esses dias turbulentos teriam sido bem menos ameaçadores ao vital agronegócio brasileiro se o governo tivesse se mirado na modesta Bolívia, que, diante do incêndio de mais de meio milhão de hectares, se apressou em requisitar os serviços de bombeiros florestais internacionais por meio de um Boeing 747, a maior aeronave empregada nesse tipo de ação. Enquanto o Brasil transmitia ao mundo incontáveis imagens de incêndios, a Bolívia produzia impressionantes cenas de combate ao fogo – e de preocupação com o ambiente.
O mesmo cuidado com a imagem vem mudando a percepção sobre a Etiópia, um dos países com os piores registros de devastação ambiental. Apesar da pobreza crônica, as autoridades locais lideram uma das maiores campanhas de reflorestamento da história. Para enfrentar as secas, a Etiópia planeja plantar 4 bilhões de árvores, 40 para cada um de seus 100 milhões de habitantes. Com isso, o país, que se confundia com desmatamento crônico, miséria agravada pelas estiagens e regimes autocráticos, começa a reverter a percepção negativa aos olhos do mundo.
Além de ameaçar o agronegócio, o despreparo governamental para lidar com questões ambientais pode atingir a meta do governo Bolsonaro de aumentar significativamente o fluxo turístico externo depois da dispensa de visto a americanos e japoneses, entre outros. A natureza brasileira é uma atração de primeira grandeza, mas também esse chamariz sofrerá por um bom tempo em razão do desastre de comunicação. Equador, Colômbia e Peru, que compartilham a floresta amazônica e fazem da natureza seu mais vistoso cartão de visitas, já aprenderam há muito que não se brinca com fogo e com a imagem internacional.