Por Cesar Zucatti Pritsch, juiz do Trabalho do TRT-RS, Juris Doctor pela Universidade Internacional da Florida/EUA e autor do livro "Manual de Prática dos Precedentes no Processo Civil e do Trabalho"
Declarações do governo reacenderam a polêmica da "carteira verde e amarela", sem direitos como 13º, férias e FGTS, supostamente para gerar mais "empregos". Sustenta-se que seria "opção", "ninguém mexe em direitos, mas daremos novas alternativas", mas o próprio presidente já disse que a legislação trabalhista "vai ter que se aproximar da informalidade".
Iria o governo ao ponto de disfarçadamente revogar direitos constitucionais? Tornar direitos aparentemente "opcionais" evitaria a inconstitucionalidade por ofensa a cláusulas pétreas?
Negativo. "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: ... os direitos e garantias individuais" (parág. 4º, IV, do art. 60 da Constituição), dentre os quais estão os direitos dos trabalhadores, art. 7º. O constituinte buscou evitar que maiorias temporárias pudessem aniquilar conquistas civilizatórias, seja alterando a Constituição, seja por seu esvaziamento, "tendente" a abolir tais direitos.
É o caso aqui. A "opção" pela carteira "verde e amarela", nua de direitos, é ilusória. Alguém acredita no conto de que tal contrato não será imposto como condição de contratação?
Tivemos situação idêntica nos anos 60. O empregado que atingisse 10 anos de serviço só poderia ser despedido por falta grave ou força maior (art. 492 da CLT). No entanto, sem revogar tal artigo, foi criado sistema paralelo. O trabalhador "optaria" por não ter direito à estabilidade em troca receber depósitos mensais de 8% do salário em um Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço. Todos sabem o que aconteceu, a partir de 1967 ninguém mais era contratado se não exercesse a "opção" pelo FGTS, renunciando à estabilidade.
A mudança agora será mais cruel – o trabalhador renunciará a seus direitos em troca de ... nada. Pela rotatividade de empregados, em cinco ou seis anos quase todos já terão exercido tal "opção". O regime atual, com os direitos constitucionais trabalhistas, terá virado pó, "tendendo" à abolição, violando o §4º do art. 60 da Constituição.
Acredita-se que o governo não se arriscará em tamanho ataque à Constituição, já que uma rejeição no Congresso lhe desgastaria. Todavia, se impuser renúncia a direitos constitucionais mediante tal opção fictícia, e se tal inconstitucionalidade não for detectada pelo próprio Parlamento, o reconhecimento da inconstitucionalidade pelo Judiciário é o destino mais provável.