Por Luiz Antônio B. Custódio, arquiteto do Iphan e professor da Uniritter
Nestes tempos de comemorações farroupilhas, de busca de referências para compor uma imagem, fui perguntado: e a arquitetura gaúcha, como é que é?
A arquitetura, como hábitat, sempre relaciona o homem ao seu espaço, ao longo do tempo. Às culturas e aos materiais do território. Em nosso caso, ao pampa, amplo e sem fronteiras.
Tivemos vários momentos: o dos nativos adaptados à diversidade ambiental, ao frio, nas casas subterrâneas do planalto entre os pinheirais; em abrigos sob rochas nas bordas da serra; erguendo cerritos, aterros circulares no litoral alagadiço; protegendo-se com toldos, em campos abertos. Depois, a ocupação espanhola nas Missões, com povoados ordenados, casas esfumaçadas pelo fogo de chão dos guaranis. Os padres trouxeram o gado e criaram as primeiras estâncias com cercas de pedra espalhadas pelas coxilhas. Logo chegam os lusos, dos Açores ou já do Brasil. Entraram pelo Rio Grande, como se chamava a Lagoa dos Patos. Se arrancharam em Viamão e de seu Porto percorreram o Jacuí, povoando suas margens. No Sul, charqueadas, com escravos negros.
Mais tarde foram chegando outros imigrantes: alemães, depois italianos, que configuraram paisagens características em vales e serras, adaptando referências às possibilidades locais. E logo vão chegando todos os outros, contribuindo, à sua maneira, à integração urbana e rural.
A figura campeira do gaúcho, celebrada neste período, configura-se principalmente pelo legado dos primeiros, somando costumes de nativos, missioneiros e açorianos. Reunindo mate, gado, couro, cavalo, carne assada e religiosidade, nas estâncias, charqueadas e nos povoados.
E a arquitetura? Cada cultura contribuiu um pouco neste processo. Os nativos com seu amplo conhecimento ambiental; os missioneiros, com construções que juntaram tradições nativas com estruturas europeias; os açorianos, buscando semelhanças com raízes portuguesas, nas aberturas ritmadas, janelas em guilhotina, telhados de barro, beirais curtos, casas dispostas ao longo das ruas sinuosas. Cidade alta, cidade baixa.
No campo, as casas, o galpão, as mangueiras de pedra, a cacimba e alguns umbus. Em algumas regiões, casas de torrão, construídas com leivas de pasto, cobertas por capim. E geralmente acompanhadas pelo canto familiar do quero-quero, localizando a paisagem. Esse conjunto de contribuições sintetiza a imagem da arquitetura vinculada à figura idealizada do gaúcho.
Mas e os demais? As contribuições posteriores dos diferentes grupos que hoje convivem no mesmo território também fazem parte da história arquitetônica desta parte do Brasil. Com diferentes sistemas construtivos, formas e estilos. Dos alemães, com estruturas engradadas; dos italianos, com casarões de pedra ou madeira; em todas as áreas, a sofisticação das referências europeias, neoclássicas, ecléticas, art nouveau, art déco, modernistas e contemporâneas. Que em qualquer lugar são fontes de riqueza. Por aqui, é preciso conhecer, para reconhecer e preservar. Patrimônio gaúcho.