Por Leandro de Araújo, educador e fotógrafo
Sob o Viaduto da Conceição, Centro de Porto Alegre, há um terminal de ônibus onde milhares vem diariamente à capital gaúcha. À tarde longas filas aguardam o transporte para suas casas após o dia de trabalho. Há um banheiro público, questionável no que diz respeito à segurança e à higiene. Ao lado deste um casal de moradores de rua preparava o "acampamento".
Eram 18 horas. Ele arrasta um colchão de solteiro velho e uma mochila. Põe o colchão próximo à parede do banheiro, ajuda a mulher a deitar, tira algo de um saco e coloca sob sua cabeça como um travesseiro, abre a mochila, retira um cobertor velho e a cobre. Senta-se próximo aos seus pés e, sorrindo, estende as mãos e mexe em seus cabelos. Ela sorri. Conversam um pouco até que ele levanta e sai. Um minuto depois volta com um pedaço de pão e um pote de iogurte aberto. Senta aos pés de sua companheira. Divide o pão. O iogurte era o bônus. A mulher sorri e bebe o conteúdo do pote. Em momento algum deixaram de conversar e sorrir. Às 18 horas e 15 minutos meu ônibus começa a deixar o box. Ela, deitada novamente, segue sorrindo e conversando. O ônibus parte.
O que realmente me faz feliz? O que me chateia? Quanto esforço, tempo e dinheiro dispenso para poder sorrir?
Queremos smartphone melhor, videogame mais moderno, TV mais fina, tênis mais caro. Coisas que nos fazem felizes e sem as quais afundamos em nossa própria arrogância diante do simples e belo.
O quadro surreal mostrava ao mesmo tempo pobreza extrema e felicidade! Demorei para compreender. Habituei-me a conectar alegria a objetos e conquistas. Não imaginasse mais que alguém pudesse demonstrar tamanha felicidade com "coisas pequenas". Conceito que se mostrou completamente idiota quando retomei os detalhes. A gentileza com que ele postou a cama. A gratidão que ela demonstrou. A generosidade. A capacidade de compartilhar. A humildade em receber algo simples, mas de coração. Cumplicidade. Doação. Respeito. Amor.
Tudo ali saltando aos meus olhos. Nada que custe dinheiro. O preço para se adquirir estes valores é, apenas, ser humano.