Por Gustavo Fávero Prietto dos Santos, capitão da Brigada Militar
Em qualquer país civilizado do planeta, espaços públicos são locais de contemplação da natureza onde o som ambiente é a única coisa possível de ser ouvida, seja ele qual for. Pessoas escutam música em seus fones de ouvido, artistas de rua apresentam sua arte, pessoas se deslocam pela cidade como se percorressem um cardápio de sensações físicas, estímulos cognitivos e impressões espirituais.
A ordenação estética e sonora, mesmo que de forma inconsciente, promove a paz de espírito e mitiga as ansiedades. Locais junto a corpos d'água são, em todo mundo, preferências da humanidade. Nesse sentido, Porto Alegre é um lugar privilegiado. À beira de um majestoso, em que pese poluído lago, a cidade tem ali um magnífico espaço de silêncio e contemplação.
Recentemente, como sinal de respeito, a cidade fez esforços e com severas dificuldades inerentes às próprias mazelas burocrático-institucionais, brindou a sua população com um belo espaço público à beira do lago. Pessoas se exercitam, sorvem o tradicional mate, inspiram-se pela beleza do cenário.
Ocorre que, no último sábado, tal tranquilidade foi furtada do local. A apropriação da orla do Guaíba pela organização de um evento irregular destinado à música de estilo não uníssono representou um esbulho daquilo que serve a todos cidadãos da cidade. A liberdade de contemplar a sua forma de arte preferida não deve ser em detrimento da liberdade alheia de não o fazer.
Ninguém deveria ser obrigado por uma grande massa a ouvir qualquer tipo de música, seja clássica ou pós-moderna, principalmente quando o evento é organizado em negativa às liberdades individuais, hostilizando os direitos fundamentais. Mesmo que houvesse grande número de espaços públicos a serem ocupados de modo a contemplar todos os gostos e permitir que em iguais condições todos pudessem juntar-se em confraternização musical, ainda assim, dever-se-ia analisar a pertinência de fazê-lo.
Deus abençoe os fones de ouvido.