O cumprimento de mais uma etapa do calendário eleitoral deste ano, com a perda do foro privilegiado por parte de homens públicos que precisaram deixar seus cargos para concorrer em outubro, contribuiu para evidenciar mais uma brecha para a impunidade. Isso porque o Supremo Tribunal Federal (STJ) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram encaminhar processos relacionados a casos considerados como de caixa 2 para a Justiça Eleitoral. O risco de enfraquecimento do combate à corrupção é grande.
A questão é que, diferentemente da Operação Lava-Jato, que lida com casos envolvendo crimes diversos, como corrupção, lavagem de dinheiro, peculato e organização criminosa, a Justiça Eleitoral está mais habituada a julgar candidaturas e mandatos. E é associada tanto a um reduzido número de condenações quanto a penas brandas. Isso significa um alento para muitos políticos enrolados hoje na contabilidade de dinheiro arrecadado supostamente para financiar campanhas eleitorais.
Homens públicos não têm o direito de insistir na ideia de que a lei vale para todos, menos para eles mesmos.
Pelo menos duas dezenas dos 84 pedidos de inquérito feitos pela Procuradoria-Geral da República no âmbito da Lava-Jato referem-se hoje a doações não registradas, nas quais o político envolvido não teria oferecido de imediato alguma compensação sob a forma de contrato no setor público ou outra vantagem semelhante. Por isso, já há uma fila de homens públicos que, depois de terem se envolvido em irregularidades financeiras, planejam pleitear o mesmo tratamento, com o objetivo de se livrar da pena ou receber uma condenação mais branda.
Historicamente, a legislação eleitoral tem se prestado mais para cassar diploma ou mandato de políticos. Além disso, crime de falsidade ideológica, caso do caixa 2, costuma ter punições brandas, com prisões de no máximo cinco anos. E a pena prescreve rápido. O período, inclusive, cai para a metade no caso de quem tem mais de 70 anos. Entre tantas pressões contra a impunidade, a transferência de casos envolvendo suspeitas de caixa 2 para a Justiça Eleitoral preocupa particularmente, por significar um risco concreto de enfraquecimento do combate à corrupção.
Quem quer que esteja envolvido em casos de "recursos não contabilizados", um eufemismo para dinheiro mal havido pelo menos desde as investigações do mensalão, não pode ficar impune. Homens públicos não têm o direito de insistir na ideia de que a lei vale para todos, menos para eles mesmos.