Há um argumento prático muito evocado contra a seleção de cotistas negros em universidades federais por critérios fenotípicos (cor da pele, cabelo, traços do rosto como lábios e nariz), que afirma que, em sociedades miscigenadas como a nossa, não é possível classificar quais cidadãos satisfazem esses critérios. Logo, cotistas não deveriam ser selecionados por traços fenotípicos, pois não seríamos capazes de dizer, com um mínimo de objetividade, quem é negro.
Um problema sério nesse tipo de argumento é a fragilidade de sua principal premissa. Afirmar que não há como distinguir objetivamente brancos de pardos e negros é um evidente exagero. Não podemos inferir uma dificuldade absoluta de uma dificuldade circunscrita a alguns casos.
O atual sistema implementado pela UFRGS, a pretexto de garantir justiça, faz o contrário
O debate em torno do sistema de seleção foi reavivado recentemente pela decisão da Comissão Permanente de Verificação da Autodeclaração Étnico-Racial da UFRGS. Salvo melhor juízo, pelo novo critério, um candidato branco que se autodeclarar negro ou pardo, se comprovar ter pais e/ou avós negros, será considerado cotista negro. Na prática, a UFRGS substitui um método que tem ajudado a garantir a diversidade racial, principalmente nos cursos mais disputados, por método nenhum. Afinal, se um grande número de candidatos fenotipicamente brancos com antepassados negros se valerem do sistema de cotas, a UFRGS voltará a ser, como foi por muitos anos, um reduto de brancos.
Um outro problema desse sistema é que o racismo à brasileira é cromático e não genético. A vítima do racismo não é o branco que tem sangue negro, mas aquele que, pela cor da pele e traços do rosto, é socialmente classificado como negro e, como consequência, discriminado quando busca emprego, perseguido quando circula por ruas e shoppings, ofendido nas redes sociais etc.
O atual sistema implementado pela UFRGS, a pretexto de garantir justiça, faz o contrário. Seria melhor promover ajustes debatendo o assunto com representantes dos grupos atingidos pela proposta.