Em meio a tanta notícia ruim, roubalheira, injustiça, violência, impunidade, que temos assistido e vivido nos últimos tempos, algo novo começa a acontecer no país. Uma das mais premiadas escolas de samba, a Beija-Flor, entrou na avenida com o tema "Os filhos abandonados da pátria que os pariu". Outra, a Tuiuti, desfilou com carteiras de trabalho na mão e fantoches manipulados por mãos poderosas, fazendo uma severa crítica social ao trabalho escravo que ainda existe entre nós. Ambas foram as vencedoras do maior Carnaval do Brasil. Ambas usaram o Carnaval como instrumento pedagógico e de conscientização.
Muitos blocos, de Norte a Sul, se juntaram às críticas à corrupção e ao descaso de prefeitos, parlamentares, governadores, ministros e do presidente da República. "O povo começou a acordar", "a esperança sucumbiu", "meu canto é resistência", "ganância vem de terno e gravata", "não sou escravo de nenhum senhor", "teus filhos já não aguentam mais" são algumas das expressões presentes nos sambas-enredo das duas escolas. O povo, na avenida, cantou junto e forte o refrão da Beija-Flor. E, espontaneamente, saiu desfilando atrás da escola, dando aval ao que tinham acabado de assistir.
Na avenida, o prédio da Petrobras virou uma favela, a costureira escravizada, malas de dinheiro, trabalho informal, o vampiro com faixa presidencial, o pato da Fiesp manipulado, crianças sendo mortas em plena sala de aula, enquanto manifestoches remetiam aos manifestantes manipulados pelos poderosos nos panelaços para derrubar Dilma, entre tantas imagens que repudiaram a situação do Brasil.
Nas entrevistas, frases como "Carnaval não é feito só de luxo. Luxo é dar saúde, segurança e educação para o povo". Pouco antes da transmissão do Carnaval, a TV Globo exibia a novela O Outro Lado do Paraíso. Racismo e segregação, corrupção do Judiciário, pedofilia na polícia, abuso sexual infantil, trabalho escravo, violência contra a mulher, prostituição, famílias fazendo qualquer coisa por dinheiro. Ficção e realidade se fundiram na telinha de maneira escrachada. Duas das maiores "audiências" deste país – Carnaval e novela das 21h – ao tratar de temas fundamentais para que o Brasil recupere a seriedade e o respeito por sua gente, mostraram para muitos que não querem saber de política a importância de se interessar pelo assunto. O ano começou bem, pelo menos nesses quesitos. Mesmo que tardia, a reação já dá a batida do que poderá ser a construção de um novo Brasil, menos desigual e mais competitivo. Momento de repensar a política na eleição deste 2018, que recém começou.