* Jornalista
Uma das mais recentes polêmicas no Rio Grande do Sul, com respingos no país e da qual não haverá qualquer lembrança em poucos dias, é pouco produtiva, como ocorre com frequência. As redes sociais e a mídia tradicional discutem o recreio temático promovido em uma escola particular, para o qual os estudantes foram convidados a usar fantasias alusivas a profissões que adotariam "se nada der certo".
Fora os xingamentos nas redes, que não merecem atenção, houve quem buscasse explicações para a controvérsia envolvendo a depreciação de determinadas categorias de trabalhadores. Duas linhas básicas de argumentação se formaram. Na primeira, está quem aponta o fundo preconceituoso desta recreação, que, indiretamente, expõe uma estrutura social desigual, perene e normalmente pouco visível. No fim, os alunos fantasiados estão apenas reproduzindo o cotidiano brasileiro, sem qualquer reflexão. A segunda linha concentra aqueles que desdenham das análises direcionadas ao recreio temático. Para esses, os críticos apenas jogam suas frustrações pessoais sobre uma brincadeira inocente.
Se essa segunda linha entra em um beco sem saída ao negar um fenômeno evidente, a primeira ganha destaque ao propor uma análise mais ampla, que remete ao trabalho do sociólogo Jessé Souza. Em seus estudos sobre os "batalhadores", esse pesquisador aponta as distinções sociais que separam a classe média tradicional, detentora do capital cultural, das classes trabalhadoras emergentes - uma diferença que se reproduz ao longo dos anos e que, neste momento, torna a festa "se nada der certo" um impasse entre visões de mundo.
Não parece eficaz que o debate permaneça restrito a essas duas maneiras de pensar. Mais vantajoso seria discutir como fazer "para tudo dar certo". Na sala de aula, os estudantes poderiam ser encorajados a planejar melhor seu futuro e a exercitar a pluralidade. No sistema educacional, a questão seria como elevar os índices de aprendizagem sem preconceitos contra políticas que apresentem êxitos. No modelo tributário, como torná-lo mais justo. Na estrutura carcerária e punitiva, como poder reduzir, e não aumentar, o número de cadeias.
No país, seria possível exercitar formas de tornar o princípio meritocrático aplicável a todos, com um ponto de partida mais equitativo. Mas desconfio que o problema mais premente é resolver a atual etapa da crise política, cujo centro está em um presidente que teve um auxiliar flagrado carregando mala com R$ 500 mil. E ele nem precisou usar fantasia.