* Vice-presidente Administrativa da Ajuris - Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul
Engana-se quem pensa que a chamada Lei de Abuso de Autoridade, aprovada recentemente no Senado, é do agrado da magistratura gaúcha. Mesmo admitindo-se que foram retiradas duas tremendas barbaridades do substitutivo do senador Roberto Requião (PMDB-PR), a lei ainda representa uma ameaça ao trabalho independente dos juízes, como também dos promotores e demais autoridades do sistema judicial. Por isso, a luta dos magistrados em favor de um texto que não cerceie agentes públicos que investigam, processam e julgam crimes de corrupção deve prosseguir, agora na Câmara dos Deputados.
Como disse no Plenário o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), que votou contra o substitutivo, a retirada de absurdos como o crime de hermenêutica e a possibilidade de o magistrado ser processado pelo réu apenas "despiorou" a matéria - votada, segundo ele, em um momento inoportuno em razão da Lava-Jato e da suspeição que recai sobre muitos congressistas. Aliás, o senador também apontou que a Lei de Abuso de Autoridade não prevê penalização para parlamentares.
A independência é imprescindível para que o magistrado alcance à sociedade uma boa prestação jurisdicional. Não só a independência, como também o apuro técnico ao longo da instrução do processo até a decisão, que fica submetida a graus superiores e pode ser eventualmente reformada. O certo é que, sem independência e coagido por artifícios legais casuístas, o juiz fica prejudicado no seu mister de ser imparcial, isento e equilibrado em relação às partes.
Circula com força em algumas das mais importantes entidades de classe do mundo jurídico – entre as quais a Ajuris, a primeira associação do gênero no Brasil –, o pensamento de que ainda é preciso remover dispositivos que remanesceram no texto e só causam insegurança no combate à corrupção, chaga que consome recursos do país. Entre esses entraves estão os que criminalizam a prisão preventiva e as prerrogativas dos advogados, sem falar na questão de tipos penais abertos.
A Ajuris, detentora de considerável patrimônio em defesa das prerrogativas judiciais – que, em última análise, não são do juiz, mas sim da cidadania, a quem se destina o trabalho do magistrado –, está, desde já, mobilizada para buscar o aperfeiçoamento dessa lei na Câmara dos Deputados. Para o bem do país.