A Câmara Municipal de Porto Alegre não se ajuda. Os vereadores da Capital reclamam, muitas vezes com razão, da falta de cobertura de suas atividades por parte da imprensa ou da supervalorização de atos sem maior importância. Não é caso da sessão de quinta-feira, quando o plenário aumentou de R$ 19,4 mil para R$ 30.471,11 o teto salarial dos servidores do município. Foi uma decisão irresponsável.
Os servidores devem ser devidamente remunerados. Eles não têm culpa pela crise e pelos erros de sucessivas gestões. Mas a realidade atual aponta para a austeridade. Nem mesmo a folha atual será paga em dia daqui para a frente.
Dois fatos ajudam a entender como uma decisão tão esdrúxula e inaceitável pode ter sido levada adiante por quem foi eleito justamente para defender os interesses da comunidade. Um deles é a tentativa, em todos os sentidos equivocada, de enviar um recado ao prefeito Nelson Marchezan, que reduziu o espaço para indicações políticas e para o toma lá da cá na formação de sua equipe de governo. O segundo aspecto é a sucumbência à pressão de corporações que, mesmo influentes, não representam o pensamento da maioria da sociedade, mas fazem um barulho, na maioria das vezes, ensurdecedor.
A questão concreta é que, na origem, a iniciativa do Executivo tinha por objetivo permitir uma gratificação para servidores públicos de quaisquer poderes convidados a exercer a função de secretário estadual. O objetivo pode até ser contestado também em consequência do momento difícil enfrentado pelo município, mas é justificável e de impacto mínimo nas despesas: atrair gestores qualificados. Hoje, ao serem deslocados para o primeiro escalão no município, esses funcionários acabam tendo os ganhos reduzidos. Ao alterar o projeto, a Câmara impôs uma sinuca de bico ao prefeito, que ficou sem saída: se vetar, veta tudo, inclusive o que ele mesmo propôs.
O aspecto mais difícil de entender é que, enquanto vereadores de oposição disseram não à brecha para equiparar salários de servidores municipais aos subsídios de desembargadores, praticamente toda a base de apoio ao prefeito posicionou-se favorável. Não há lógica nessa atitude, a não ser a da política antiga e desgastada. Um gol contra no momento em que os políticos deveriam se esforçar para reduzir seus níveis de descrédito generalizado.
Quando vereadores ousam elevar o teto dos servidores da Capital num momento destes, é porque não se deram conta de que o padrão da política está mudando. O Brasil não aguenta mais demagogia e apetite por cargos públicos, a qualquer preço. O novo país que está emergindo passa longe de represálias políticas pagas com o dinheiro do contribuinte e do medo da gritaria de poucos.