* Criminalista e doutor em Direito
São no mínimo curiosas as reações de diversos políticos, que se apresentam como arautos do comportamento eticamente correto, quando deparam com a publicidade de gravações feitas às escondidas de seus diálogos nada republicanos e firmados no âmbito da privacidade. Respostas recheadas de alegações de ilegalidades formais em face do caráter de gravação clandestina ou de existência de edições e carências de contextualização, entre outras, são as mais comuns atualmente.
Contudo, é de se lembrar que o registro furtivo promovido unilateralmente por um dos interlocutores, de uma regular conversa entre pessoas que se aceitam como comunicador e receptor e agem com livre expressão de pensamento, mesmo que no âmbito da privacidade, tem sido admitido pelos tribunais pátrios.
Por certo, a gravação de conversa amigável, feita por um dos que participam do diálogo e de forma clandestina, pode até ser criticada pela violação dos princípios e valores comportamentais morais, pois tal conduta não se harmoniza com o que se espera de uma relação amistosa. Porém, não há que se confundir esse comportamento com aqueles descritos pela lei como efetivamente desregrados. E aqui é oportuno o exemplo da interceptação telefônica, a qual depende de diversos pressupostos, notadamente autorização judicial, para se firmar no âmbito da legalidade.
De outra banda, com relação à argumentação de edições, basta se examinar a parte da conversa gravada que não se apresenta manipulada, para se saber se existe contextualização. Pois a mera existência de edições, seja antes ou depois, trata-se de defeito que pode ser afastado, mas que não compromete o trecho da comunicação, quando o mesmo resta exposto de forma cristalina e com límpida lógica interpretativa do objeto e de sua situação.
Nessa esteira, pode-se afirmar que não há restrição no âmbito da lei penal pátria e do atual Estado democrático de direito junto à gravação feita por um dos interlocutores do diálogo oculto.