O "especialista" é um tipo interessante. Confrontado com fato alheio a sua compreensão, responde psicologicamente com imediato mecanismo de ancoragem, elegendo fragmentos familiares, ainda que escapem detalhes do contexto geral. Isso lhe possibilita encontrar explicações para o desconhecido. Tudo de acordo com suas teses acadêmicas, obviamente.
Nos recentes massacres praticados dentro do sistema prisional, não foi diferente. A crueldade pura e simples ora é diluída em suposto determinismo social que culpa o Estado, ora é traduzida por abstrações teóricas que ultrapassam as fronteiras das obviedades e sucumbem ao primeiro teste empírico. O "especialista" não espera o esclarecimento dos fatos para apontar causas e soluções.
Mas, enquanto essas fórmulas continuam repetidas à exaustão, os donos do crime continuam negociando lucrativamente. Dentro e fora do sistema prisional. O "especialista" segue impávido, mas já agora começa a trincar sua robusta represa de conhecimento: era o Estado insuficiente em direitos humanos que esquartejou pessoas? Era o Estado no seu excesso punitivo que serrou, cortou e queimou homens vivos? Era o Estado que jogou futebol usando como bola uma cabeça humana?
Facções usam omissões estatais para recrutar e escravizar. Não há dúvida. Não há novidade. Mas também se servem delas para lucrar dentro dos presídios, para movimentar lideranças conforme convém, para gerenciar espaços que deveriam servir para contê-las. Não lhes interessa mexer nesse frágil equilíbrio, conveniente tanto aos donos do crime quanto ao Estado omisso e fraco.
Ao "especialista" tampouco interessa. Contenção efetiva não interessa. Presídio federal não interessa, mesmo que se cumpram a lei e o tratamento penal. Não interessa se execuções são determinadas de fora das penitenciárias como estratégia empresarial. Tampouco se vinculações criminosas já não dependem da aproximação física de presos. Interessa sim sua repugnância à pena corporal, expressão máxima do Estado opressor. O crime agradece. O coveiro, mais ainda.