O presídio em Manaus onde aconteceu a chacina era privado. Há um excelente documentário chamado A 13ª Emenda (emenda à Constituição norte-americana que libertou os escravos), que faz uma refinada análise do sistema carcerário dos EUA e escancara a promíscua relação entre presídios privados e a maior população carcerária do planeta. Presídios privados são a negação do Estado. Não é a negação do Estado socialista, de esquerda, como apressam-se a acusar alguns, é a negação do Estado enquanto instituição.
Max Weber definia o Estado como a instituição que, entre outras características, possuía por natureza o monopólio legítimo da violência. Isto não quer dizer que pode fazer qualquer coisa contra os cidadãos e cidadãs, mas que é o único que pode regular democraticamente as relações sociais quando elas chegam ao limite de tirar a liberdade de seus cidadãos. Weber, apesar do seu apreço pelo capitalismo, jamais pensaria em um Estado que abrisse mão de seus presídios para entregá-los à iniciativa privada, que para lucrar precisa ter sempre mais presos por menor preço! Argumentarão, com razão, os defensores da privatização do sistema carcerário que há muitos outros presídios em situação de risco no Brasil, inclusive o de Porto Alegre, que não são privados.
Entretanto, o que é necessário pontuar é que tudo que acontece nos presídios públicos estava acontecendo em Manaus, somando-se sempre a pretensão "legítima" da iniciativa privada de lucrar. A história contada foi rigorosamente a mesma que conhecemos do dia a dia do sistema carcerário brasileiro. Isto é um alerta para que o entusiasmo liberal para entregar as funções precípuas do Estado para a iniciativa privada seja pensado seriamente.
Bem, resta estarmos atentos para o fato de que a privatização dos serviços afeitos aos direitos e deveres da cidadania não pode estar nas mãos de parte desta cidadania como uma de suas atividades privadas, mas de uma burocracia profissional, competente tecnicamente, paga de forma decente e controlada pela sociedade organizada. Não podemos confundir a desorganização do Estado em um dado momento com a negação de suas funções fundamentais.