Uma das mais brilhantes construções de marcas dos últimos anos é a da Moleskine. Todo mundo conhece a famosa história dos caderninhos que, segundo a lenda, foram usados por escritores e pintores famosos, como Hemingway e Picasso. Lenda mesmo, aliás, já que a empresa foi criada apenas em 1997. Mas é o cuidado em colocar alma e storytelling num simples bloco de papel que explica alguém pagar 11 euros pelo modelo padrão, vendido quase 5 milhões de vezes a cada ano. E é esta construção de marca que justifica por que uma importadora de carro belga, a D'Ieteren NV, comprou 41% da empresa e ainda quer o resto. No dia seguinte da transação, as ações da importadora tiveram uma valorização líquida de 506 milhões de euros. Na hora de diversificar os investimentos, por que alguém haveria de investir no impresso? Talvez porque quem tem alma, tem vida, e a vida pode ser esparramada para qualquer lugar – do impresso para o digital, inclusive (você lembra de algum exemplo tão bem-sucedido do contrário?).
Em um mundo cada vez mais digital, o sucesso da Moleskine comprova que há lugar para tudo que tem conteúdo e conceito. Como a Taschen, a editora alemã de livros de alto padrão, que acaba de interromper a produção de livros digitais, pela inexpressividade das vendas. Na visão da empresa, o livro digital tem sido apenas uma reprodução simplista do impresso, e este continuará oferecendo uma experiência muito melhor do que aquele. Contudo, se o digital oferecer algo mais, então um não será concorrente do outro – o que, aliás, qualquer um que esteja vivendo intensamente a comunicação já descobriu, pois os mundos on e off (ainda existe alguém que os separe?) serão sempre complementares, pois já usamos de forma integrada.
Da descrença da velocidade do digital ao deslumbramento oriundo de sua força, passamos por vários estágios de aculturamento com um mundo novo que jamais será o mesmo. Mas, assim como a história nos mostra o convívio entre várias tecnologias em diferentes setores, na comunicação também estamos aprendendo a harmonizar e potencializar o convívio entre o impresso e o digital, da mesma forma que cada um de nós o faz no dia a dia.
Nenhum de nós jamais será 100% digital. Continuaremos sempre em busca da melhor experiência, e o escrever e folhear de páginas, com sua textura, tamanho e som, ainda continua sendo uma delas. Ao menos enquanto continuarmos minimamente humanos.