Por uma dessas ilações surpreendentes que inspiram acontecimentos insólitos, as invasões de escolas por alunos infantis e infantilizados, que o Código Penal designa como esbulho possessório, ligou-me à teoria do conhecimento, abordando e analisando o fato pelo prisma pretensiosamente original da filosofia. O Brasil conta em sua história moderna da filosofia nacional com Caio Prado Jr, historiador e filósofo paulista, autor de Dialética do Conhecimento. Magistral e inédito compêndio injustamente relegado a poucos estudiosos. Caio Prado era marxista e brilhante expositor, autor de clássicos da formação econômica do Brasil.
Lembrei-me dele, ao imaginar, se assistisse a estas estripulias afrontosas à inteligência e à ordem pedagógica escancaradas no Brasil. Seria impensável imaginá-lo debatendo seriamente qualquer assunto em igualdade com aqueles meninos. Começaria perguntando como Goethe – o que sabe esse indivíduo? Data vênia, dispensando Russell, Descartes e Wittgenstein, simplifico a proposição: o conhecimento é descendente; flui do maior para o menor. Aquele que conhece apenas aritmética não pode ensinar cálculo integral. Quem apenas sabe ler não pode ensinar teoria da literatura. Simples assim. Como admitir que mentes ignorantes e inexperientes possam desafiar superiores em idade e experiência e conhecimento, deblaterando assuntos que desconhecem? E o fazem tripudiando sobre a lei democrática?
O mais surpreendente e insuportável nessa derrocada da autoridade familiar, educacional, governamental e jurídica patenteia-se na inépcia de todos quantos são responsáveis pela ordem legal e moral. O MEC tolhido de utilizar as escolas para os exames programados com antecedência de milhares de candidatos à universidade, ao invés de desocupar de imediato a propriedade pública dos transgressores e puni-los e seus pais irresponsáveis, cede.
Transfere os locais estabelecidos! Isto é: subordina-se à ignorância atrevida e ilegal. Duvido que Caio Prado contemplasse este mistifório de infantilismo sob o prisma marxista da luta de classes. Ele era antes de tudo um brilhante pensador.