Sim, você leu certo. Há uma vedação ao encarceramento de eleitores nos períodos antecedentes e seguintes à realização dos pleitos, descontadas as exceções previstas. Isso vigora aqui desde os idos do Decreto nº 21.076, de 1932. O texto em vigor, datado de 1965, dispõe: "Nenhuma autoridade poderá, desde 5 (cinco) dias antes e até 48 (quarenta e oito) horas depois do encerramento da eleição, prender ou deter qualquer eleitor, salvo em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou, ainda, por desrespeito a salvo-conduto".
Esta redação mantida praticamente inalterada ao longo de mais de oito décadas exauriu-se. Virou um deboche. Entre juristas e estudiosos, predomina o entendimento de que a interpretação literal do artigo 236 do Código Eleitoral colide com o direito de segurança pública guindado a patamares constitucionais. Para o professor Marcos Ramayana, "consagra o artigo legal evidente exagero, que não mais merece permanecer na ordem jurídica, pois os motivos que embasaram o legislador para a adoção da regra não prevalecem nos tempos atuais" (2004, p. 353).
De fato, o Brasil mudou muito. Passou de país agrário a urbano, sua população superou os 200 milhões de habitantes, a violência é crescente e os índices de criminalidade são alarmantes. Na prática, os delitos não cessam e os criminosos não fazem feriado. É diante desta dura realidade que a regra eleitoral se mostra anacrônica, flerta com o bizarro e materializa um disparate ao obstruir o trabalho de policiais, juízes e outras autoridades na repressão aos crimes que asfixiam o cotidiano do brasileiro.
O texto vigente agride o bom senso. Exige alargamento para incluir outras hipóteses de prisão e adequar-se às garantias estabelecidas em nome da sociedade. Embora uma dezena de proposições legislativas visando alterá-lo mofe no Congresso Nacional, é inadiável sensibilizar os parlamentares para que passem a votá-las. Afinal, conforme lembra o Projeto de Lei nº 5.005/13, "são fartas as notícias acerca de pessoas que representam claro risco à ordem pública e à segurança da população, mas que desfrutam de verdadeira imunidade durante o período eleitoral".