A montagem do ministério de qualquer governo é um tratado sobre a visão patrimonialista que está no DNA do Brasil desde as capitanias hereditárias. Criativa, Dilma inventou nomenclaturas para 39 ministérios e ali aninhou partidos e forças que supostamente a apoiariam. Foi atacada por gerir um ministério que era a caricatura de um governo tão paquidérmico quanto ineficiente e impopular. Como reação, Dilma prometeu baixar esse número para 29, mas não conseguiu ir além das 31 pastas.
Em dado momento da formação de seu governo, Temer sucumbiu à tentação de manter os mesmos 31 ministérios de Dilma. Houve muita gritaria porque a quantidade de ministros passou a simbolizar o grande bazar em que se transformou a administração pública. Diante dos protestos, Temer recuou, fundiu ministérios, eliminou outros e tomou posse com 23 ministros. Mas aí veio à tona a esquizofrenia que acomete Brasília. Ao riscar ministérios da Esplanada, Temer também destampou a ira de quem encara o Estado como uma extensão da sua atividade e não como um ente que deve atender ao bem comum. Temendo uma orfandade no aparato estatal, incontáveis grupos de pressão do Brasil exigem um ministério para chamar de seu. Por trás da ambição, se ocultam o silencioso desejo de não abrir mão de privilégios ou a ilusão de que um ministério é certeza de que o setor terá recursos e atenção.
É certo que deletar ministérios não afeta a real dimensão do Estado brasileiro, uma pachorrenta e intocável constelação de autarquias, departamentos, estatais, fundações e institutos com seus concursos, planos de carreiras e dezenas de milhares de cargos para mercadejar apoios. Mas há o exemplo e o simbolismo. Os Estados Unidos são o que são com 15 ministérios – o último, de Segurança Doméstica, foi criado há 14 anos, depois do 11 de Setembro. A Alemanha também emprega apenas 15 ministros (quatro deles mulheres) e revela muito de sua concepção como nação ao contar com um Ministério da Educação e Pesquisa, duas atividades que caminham juntas. A Rússia, que é a Rússia, tem 20 ministérios.
No Brasil, muita gente quer ministério para tudo (por 12 anos tivemos o da Pesca e Aquicultura, provavelmente para não descontentar os produtores de peixes em açudes). Não por acaso Dilma se divertia nos debates da campanha da reeleição quando seus oponentes a criticavam pela quantidade de ministros. "Eu gostaria de saber que ministério você cortaria", replicava a candidata, sabendo que, no Brasil, qualquer menção a uma medida de racionalidade significa se torrar com algum partido, setor ou corporação. Dilma insistiu com sua procissão de ministros e deu no que deu porque, no fundo, o apoio baseado em cargos nunca está à venda – ele é apenas alugado por temporada.