Ao contrário de ter sido uma saída honrosa, o pedido de licença do ministro do Planejamento, Romero Jucá, constrange o presidente interino Michel Temer e lança uma sombra de descrédito sobre o novo governo. As gravações divulgadas pela Folha de S. Paulo com o teor das conversas entre Jucá e Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, não deixam dúvida: o senador tinha a clara disposição de interferir na Operação Lava-Jato, para evitar o comprometimento de políticos amigos com a corrupção.
Diante dos fatos e da lamentável explicação dada pelo ministro, dizendo que suas declarações se referiam à economia do país – e não à Lava-Jato –, o presidente em exercício nem deveria ter esperado que o amigo tomasse a iniciativa de se afastar. Romero Jucá menosprezou a inteligência dos brasileiros com argumentos que não resistem à escuta das gravações. Só por isso, já merecia ser excluído de um governo que se comprometeu com o combate à corrupção e com o respeito à ética.
Temer já sabia que seu amigo e companheiro de campanha pelo impeachment estava sendo investigado pela Operação Lava-Jato. Porém, sob o pretexto de que investigado não é condenado, optou por formar um ministério com Jucá e outros suspeitos de envolvimento em operações pouco republicanas. Agora, obrigado a exonerar o companheiro de partido para que reassuma seu mandato no Senado, poderia aproveitar a oportunidade para revisar também outras nomeações. Mais do que isto: poderia repensar a existência do próprio Ministério do Planejamento, que inexiste em democracias evoluídas e tem atribuições conflitantes com o Ministério da Fazenda.
Outro aspecto que merece ser evidenciado do episódio Jucá é o trabalho da imprensa na denúncia e na elucidação de irregularidades. Acusada de "golpista" por integrantes e militantes da administração anterior, a mídia profissional e independente continua exercendo sua atribuição de fiscal dos interesses da sociedade em relação aos governantes, sejam eles quem forem, como é recomendável numa democracia.
Neste sentido, vale lembrar que o presidente interino Michel Temer será acompanhado com lupa e cobrado em suas hesitações, como ocorre neste afastamento constrangido do ministro que falou demais e revelou más intenções. O momento não poderia ser pior: quando o Congresso examina o pedido de mudança da meta econômica.