O termo presidencialismo é um eufemismo. Na verdade, é monarquia, ou seja, governo de um só. A sucessão hereditária ou a escolha pelo voto são roupagens que não mudam o cerne. Nesse sistema, o monarca precisa submeter, de alguma forma, o Parlamento e até o Judiciário. Nos casos de não submissão, a máxima "reina mas não governa" é perfeita. Em 1889, não tínhamos monarquia, vigia o parlamentarismo e o imperador exercia um dos poderes (a exemplo da Inglaterra, que eliminou a monarquia em fins do século 17). Uma reles cópia do sistema monárquico americano - criado em 1776 por não ser encontrada uma "família real" - produziu o nosso monstrengo, também copiado em toda a América Latina. Aliás, o que une a intrínseca e normal instabilidade institucional dos latino-americanos é o igual sistema de governo que para crises só tem saídas traumáticas.
De fato, se nos últimos cem anos, nos países desenvolvidos, não monárquicos, inclusive os que mantêm famílias reais, houve centenas de afastamentos constitucionais (quedas de gabinetes) e nenhum golpe; na América Latina, centenas de golpes e raríssimos afastamentos constitucionais, o primeiro no Brasil em 1992. Tragicamente, a saída traumática das ditaduras gera os grandes períodos de "estabilidade", ou seja, quando é alcançado aquele desiderato: a completa submissão do Parlamento e do Judiciário.
Pior, o malfadado sistema foi infectado em seu nascedouro por uma espécie de moralismo religioso. Afastamento do monarca só em casos de desvio de conduta, jamais por incompetência, mesmo que altamente lesiva à nação e, em especial, às gerações vindouras. Literalmente, o cetro é conquista, não é apenas mandato, missão. Nos casos de má escolha, é exigido que, sem dó nem piedade, o povo purgue sua culpa até o fim. O pecado é mortal, sem arrependimento eficaz. Se o povo errou, deve pagar, mesmo que tenha sido vergonhosamente ludibriado na campanha eleitoral.