Os protestos dos agricultores não recuam na União Europeia (UE), em particular na França, onde o bloqueio de rodovias prossegue pelo 14º dia consecutivo, apesar das concessões da Comissão Europeia.
Quase "mil tratores ou máquinas agrícolas" tomaram várias avenidas de Bruxelas, na Bélgica, horas antes de uma reunião de cúpula dos líderes dos 27 países da UE, informou a polícia belga.
Na quarta-feira (31), agricultores franceses e belgas bloquearam um acesso da fronteira entre os países para criticar os acordos comerciais com países de fora do bloco e exigir "anúncios contundentes" na reunião de Bruxelas.
Embora a revolta dos produtores agrícolas não conste na agenda da reunião, o presidente francês Emmanuel Macron deve abordar o "futuro da agricultura europeia" com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Um dos principais pontos de tensão é o acordo que UE e Mercosul negociam há 20 anos e que, segundo os agricultores, representaria um duro revés para o setor na Europa.
O ministro da Economia da França, Bruno Le Maire, ressaltou a disposição de Paris de travar uma batalha com a Comissão Europeia contra a assinatura do acordo em sua forma atual com o bloco sul-americano, formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.
Contudo, o presidente da associação patronal francesa Medef, Patrick Martin, declarou-se favorável ao acordo comercial, ao mesmo tempo que afirmou:
— Precisamos esperar e verificar se os quatro países sul-americanos envolvidos respeitam um mínimo (de regras) em matéria ambiental e social.
Detenções
A França, onde a pressão não dá trégua nas rodovias ao redor de Paris, continua sendo o epicentro dos protestos. A tensão aumentou na quarta-feira com as primeiras detenções, pouco mais de cem.
Durante a manhã foram liberados os últimos 79 agricultores detidos após a invasão do mercado atacadista de Rungis, centro de alimentos crucial de Paris e um dos maiores do mundo.
O sindicato Coordenação Rural, que convocou o bloqueio a Rungis, sugere agora que os agricultores sigam até a Assembleia Nacional (Câmara Baixa do Parlamento) de Paris para uma "reunião" com deputados.
Arnaud Rousseau, líder do principal sindicato agrícola francês, FNSEA, pediu "calma" e advertiu que as "expectativas são enormes diante do acúmulo de normas, mas que muitos temas não podem ser resolvidos em três dias".
As medidas anunciadas pelo governo francês e as concessões da Comissão Europeia, em particular a revogação "parcial" em 2024 da obrigação de deixar 4% das terras aráveis em pousio, não parecem suficientes para convencê-los.
Enquanto aguardam possíveis anúncios do governo nesta quinta-feira (1º), os protestos continuam em toda a França. Nas proximidades de Perpignan, sul do país, quase 60 tratores prejudicam o trânsito em uma importante rodovia que leva à Espanha.
— Seguimos mobilizados porque as medidas anunciadas não estão à altura de nossas expectativas e do que está em jogo — declarou à AFP Bruno Vila, líder agrícola local.
Portugal, Itália, Espanha
A mobilização também afeta outros países da UE. Depois da França, Alemanha e Itália, os agricultores portugueses tomaram nesta quinta-feira as rodovias do país com seus tratores para exigir a "valorização" de sua atividade.
Na Espanha, o ministro da Agricultura, Luis Planas, anunciou que receberá na sexta-feira (2) representantes dos três principais sindicatos do setor, que ameaçam iniciar uma mobilização nas próximas semanas.
O setor rural espanhol enfrenta um momento difícil devido à seca que a afeta há três anos e reduziu consideravelmente as colheitas de azeitonas e cereais. Os sindicatos também denunciam a "burocracia asfixiante" da UE.
Apesar das situações diferentes, as mesmas reclamações são ouvidas na maioria dos países europeus: uma política da UE muito complexa, receitas muito baixas, inflação, concorrência estrangeira, acúmulo de regulamentações.
Além da revogação do pousio, a Comissão Europeia também anunciou na quarta-feira que vai estudar um mecanismo para limitar as importações da Ucrânia, em particular de aves.
A nova Política Agrícola Comum (PAC), um dos pilares das políticas da UE e responsável por estabelecer as condições para a concessão de subsídios agrícolas, e o Pacto Verde climático cristalizam o mal-estar.