O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, nessa terça-feira (22), em uma transmissão nas redes sociais, que o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (Brics) não quer ser um contraponto ao G-7 e aos Estados Unidos. A fala contraria o discurso adotado pelo ex-chanceler brasileiro Celso Amorim, atual assessor direto do presidente Lula a respeito de política externa. Amorim sugeriu que o bloco é uma alternativa ao G7, grupo de países mais ricos do mundo.
— Todo o interesse que existe na expansão do Brics, de países que desejam ser parceiros ou membros plenos, demonstra que há uma nova força no mundo, que não pode mais ser visto como sendo ditado pelo G7 — disse Amorim, que participa da cúpula do Brics em Johannesburgo, na África do Sul.
Horas depois, Lula adotou um tom mais conciliador.
— Não queremos ser contraponto ao G7. A gente quer se organizar. Queremos criar uma coisa que nunca existiu. O Sul Global sempre foi tratado como a parte pobre do planeta. O Brics não significa tirar nada de ninguém. Não é a simbologia da rivalidade, mas de criar um organismo novo, forte, que tenha muita gente e muitos recursos — concluiu.
Influência
Amorim é o mais influente conselheiro de Lula em política externa. Ele ficou à frente do Itamaraty de 2003 a 2015 — além de um breve período no governo Itamar Franco (1993 a 1995), ultrapassando o Barão do Rio Branco como o chanceler brasileiro que mais tempo ocupou o cargo.
No terceiro mandato de Lula, Amorim muitas vezes faz o papel de chanceler informal. Em abril, ele fez uma visita à Rússia para tentar colocar o Brasil como mediador do conflito na Ucrânia.
Em maio, foi à Ucrânia para apagar o incêndio causado pelas falas de Lula sobre a responsabilidade de Estados Unidos e Europa na guerra. Na semana passada, ele foi enviado a Cuba para reaproximar o Brasil do governo do presidente Miguel Díaz-Canel.
Expansão
Na cúpula de Joanesburgo, o ex-chanceler estará presente no exclusivo retiro de líderes, onde serão tomadas decisões sobre a expansão do Brics — um obsessão da China — e a adoção de moedas alternativas ao dólar no comércio exterior — uma preocupação brasileira.
A declaração de Amorim ecoa planos da China e contrasta com visões dentro do próprio governo brasileiro. Na terça-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o bloco não significa um "antagonismo" a outros fóruns internacionais.
— O Brics tem uma grande contribuição a dar. Brasil, África do Sul, Índia, China e Rússia podem, cada um a partir de sua perspectiva, oferecer ao mundo uma visão coerente com seus propósitos, que não signifique nenhum tipo de antagonismo a outros fóruns importantes dos quais participamos — declarou.
O Brasil resiste à expansão do Brics. O temor é de o governo se indispor com parceiros, como EUA e União Europeia. Do outro lado da corda está a China, mais poderoso membro do bloco, que pressiona pela inclusão de outros países, o que alteraria o perfil político, econômico e demográfico do Brics.
O entendimento de diplomatas brasileiros é o de que os chineses pretendem formar um bloco cada vez mais antagônico ao Ocidente e ao G7, com a provável expansão e a entrada de países como Arábia Saudita, Emirados Árabes, Indonésia, Argentina, Irã e Egito.
Neocolonialismo
Embora negue que o Brics seja um grupo antagônico ao G7, Lula segue comparando os blocos, afirmando que, em termos econômicos, o Brics ultrapassou o G7 e responde por 32% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial em paridade do poder de compra.
Ainda na terça, Lula voltou a criticar o que considera protecionismo disfarçado de americanos e europeus.
— Não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias sob pretexto de proteger o meio ambiente — ressaltou.