Risco iminente de invasão ou intimidação para impor seu ponto de vista ao Ocidente? As tropas russas concentradas na fronteira ucraniana oferecem a Moscou uma ampla gama de opções, segundo especialistas, que acreditam que uma intervenção militar seletiva é mais provável do que uma operação em larga escala.
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, se reuniu nesta sexta-feira (21) em Genebra com o russo Serguei Lavrov, num momento de tensão crescente entre Moscou e Washington e seus parceiros europeus.
Blinken alertou que se a Rússia cruzar a fronteira, provocará uma reação "rápida e dura" dos Estados Unidos, que suspeitam que Moscou queira invadir a Ucrânia.
O Kremlin, que nega qualquer plano de ataque, insiste que a desescalada exige garantias escritas para sua segurança, em particular no que diz respeito à Otan, que planeja reforçar sua presença nesta histórica área de influência russa.
Nas últimas semanas, a Rússia mobilizou dezenas de milhares de soldados, tanques e artilharia perto da fronteira ucraniana, com a ajuda de recursos militares do extremo leste do país.
Na sexta-feira passada, a Ucrânia anunciou que havia sofrido um ataque cibernético contra vários de seus ministérios.
Paralelamente, vários navios russos de desembarque de tanques e tropas deixaram o Báltico nos últimos dias e se dirigem para o sul, provavelmente em direção ao Mar Negro.
Além disso, "os russos anunciaram um exercício em larga escala em Belarus, de 9 a 20 de fevereiro, no qual estão movendo todo tipo de equipamento militar, aviões de combate, mísseis antiaéreos, etc.", segundo William Alberque, diretor de pesquisa do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS).
Como resultado, "a Ucrânia estará completamente cercada por quase uma centena de grupos de combate russos": ao norte, Belarus, ao sul, a presença russa na península ucraniana da Crimeia - anexada em 2014 -, e a leste, o Donbass, mergulhado em uma guerra com separatistas pró-russos.
- Fator climático -
"Do ponto de vista militar, a Rússia se prepara para uma ampla gama de eventualidades, desde perturbação psicológica - através da mídia e ataques cibernéticos - até uma invasão", diz Mathieu Boulègue, do think tank britânico ChathamHouse.
Para Moscou, a questão não é mais "se", mas "quando" e "como" intervir na Ucrânia, aponta o especialista, que acredita que "a Rússia está apenas esperando uma desculpa".
Especialmente porque Moscou está sob pressão do tempo, porque é "difícil manter 85.000 ou 100.000 soldados longe de suas bases por muito tempo. É preciso manter sua capacidade operacional e sua implantação tem um custo logístico significativo", ressalta Boulègue.
Além disso, há o fator climático.
"Na minha opinião, a Rússia tem uma janela de oportunidade agora e até que as temperaturas comecem a subir novamente na Ucrânia. A partir da primavera, os veículos blindados seriam um pesadelo para manobrar em terrenos encharcados", diz William Alberque.
Alguns serviços de inteligência militar europeus, especialmente os franceses, são mais cautelosos do que os americanos sobre as intenções ofensivas russas na Ucrânia.
Os quatro especialistas entrevistados pela AFP acreditam que a opção mais provável é atacar alvos estratégicos sem cruzar a fronteira.
"As forças concentradas na fronteira ucraniana não são suficientes para uma invasão e ocupação massiva do país", estima Pavel Baev, do Instituto de Pesquisa para a Paz de Oslo, lembrando que "quando a União Soviética invadiu a Tchecoslováquia em 1968, enviou pelo menos o dobro de tropas que a Rússia colocou na fronteira ucraniana".
De acordo com o pesquisador, a escalada vai tomar a forma de "ataques aéreos, contra os quais a Ucrânia é vulnerável" devido à falta de defesas aéreas e forças aéreas fortes.
"A Rússia não tem interesse em invadir a Ucrânia. O custo político e militar de ocupar aquele território seria muito grande. Putin não precisa disso para criar uma forma de vitória", concorda Mathieu Boulègue.
"Poderia se limitar a usar fogo de artilharia e ataques aéreos contra centros de comando e controle ucranianos, para destruir sua capacidade de retaliação, sem ter que deslocar tropas", acrescenta.
Uma análise compartilhada por Keir Giles, da Conflict Studies Research do Reino Unido. "Moscou pode atingir seus objetivos por muitos outros meios além de invadir a Ucrânia. A Rússia já alcançou seu objetivo principal: pressionar os Estados Unidos a discutir o futuro da arquitetura de segurança europeia", conclui.
* AFP