O economista de esquerda Luis Arce assume a presidência da Bolívia neste domingo (8) com o desafio de conseguir a reconciliação, reativar a economia e mostrar que é ele quem manda e não seu padrinho político Evo Morales, que voltará ao país na segunda-feira (9).
— Os desafios do próximo governo são a reconciliação de um país em conflito e a solução de múltiplas crises. Tudo isso desde a mudança de um estilo de governo, que não seja intransigente como o de Morales — diz o analista político Carlos Cordero.
Os múltiplos desafios têm a ver com a polarização política, o confronto entre as regiões oriental e ocidental, as tensões entre o campo e a cidade, o ressurgimento das expressões de racismo, a parcialidade da justiça e a recuperação de uma economia em crise.
Como herdeiro político de Morales, Arce venceu as eleições de 18 de outubro no primeiro turno com retumbantes 55% dos votos, superando amplamente seu principal rival, o centrista Carlos Mesa.
— Apesar de Luis Arce ter sido ministro de Morales por muitos anos, há esperança de que ele conduza um governo que não seja um retorno ao passado, que não seja um governo autoritário como o de Evo Morales — afirma Cordero.
Governar para todos independentemente de ideologia política foi a promessa da campanha eleitoral de Arce e o analista considera que os seus primeiros sinais devem apontar para esse fim.
Um dos grandes desafios do novo presidente "é consolidar sua própria legitimidade diante de uma figura tão forte e também agressiva na mídia como Evo Morales", diz a cientista política Ximena Costa.
Desde o primeiro momento, Arce deve deixar claro que ele será o verdadeiro governante, e não Morales nos bastidores. Essa decisão depende da correlação de forças dentro do Movimento pelo Socialismo (MAS), onde uma corrente moderada e uma corrente mais radical e conflituosa lutam pelo retorno ao poder do ex-presidente, hoje asilado na Argentina.
Morales (2006-2019) confirmou neste sábado (7) que retornará à Bolívia na segunda-feira, um ano depois de renunciar após perder o apoio das Forças Armadas em meio a protestos contra ele e denúncias de fraude eleitoral.
O ex-presidente entrará em uma caravana pela fronteira com a Argentina e fará uma viagem de 1.100 quilômetros até Cochabamba, onde emergiu como o líder dos plantadores de coca, em uma jornada que ameaça chamar a atenção nacional e internacional, ofuscando a agenda da Arce em La Paz.
Outro grande desafio para o novo presidente de 57 anos é a recuperação do aparato econômico, atingido pela pandemia. Como ministro da Economia, Arce se gabou de ter alcançado altas taxas de crescimento e de reduzir os índices de pobreza e desigualdade, em um período de expansão favorecido pela alta dos preços das matérias-primas.
Desde junho passado, a economia boliviana apresentava uma taxa de crescimento de -11%, um déficit fiscal de 9%, maiores níveis de endividamento, diminuição da arrecadação tributária e perda de reservas.
Nesse contexto totalmente adverso, Arce terá de demonstrar sua capacidade de fazer milagres novamente, mas será difícil para ele sem apoio político além do partido no poder. Para isso, ele deve dar passos em direção a seus oponentes.
Os analistas acreditam que, para demonstrar boa vontade, o MAS deveria anular a decisão do parlamento cessante que modificou um regulamento interno reduzindo o quórum para aprovar certas disposições.
Essa modificação foi feita no último minuto para garantir que o MAS continue controlando o Congresso boliviano, apesar de ter perdido a maioria de dois terços, agora com maioria simples.
Em protesto, a bancada da oposição anunciou que não comparecerá à posse de Arce, um mau presságio para o novo presidente.