O executivo Carlos Ghosn, 65 anos, que já foi o venerado CEO de três grandes companhias automotivas, surpreendeu o mundo ao fugir do Japão, onde se encontrava sob prisão domiciliar por supostos crimes financeiros. Desde segunda-feira (30) abrigado no Líbano, é alvo de pedido de detenção por parte da Interpol, a polícia internacional, que já foi negado pelo governo de Beirute.
No Japão, as autoridades fizeram buscas na casa de Ghosn a procura de informações que possam ajudar a esclarecer como se deu a fuga. Na Turquia, sete pessoas suspeitas de colaborar com a movimentação foram presas. Em um comunicado, o executivo, nascido no Brasil e também com cidadania libanesa e francesa, declarou que organizou tudo sozinho. Confira a trajetória de Ghosn e o que se sabe até agora sobre sua fuga.
Do Brasil ao mundo automotivo
Nascido em 9 de março de 1954 em Porto Velho (RO), Carlos Ghosn Bichara cresceu no Líbano, em um ambiente multicultural, estudando em colégio jesuíta. Aos 20 anos, ingressou em prestigiada escola de engenharia politécnica, na França. Quatro anos depois, foi contratado pela Michelin. Em 1996, deixou a fabricante de pneus após 18 anos e assumiu a vice-presidência de compras da Renault.
O franco-libanês-brasileiro desembarcou no fim da década de 1990 no Japão, onde transformou hábitos em termos de gestão empresarial. Mais tarde, assumiu a chefia da Nissan – comprada pela Renault –, cargo que acabou acumulando, no início dos anos 2000, nas duas montadoras.
Em 2016, a Nissan obteve o controle acionário da Mitsubishi. Um ano depois, ele deixou a chefia da Nissan.
Pesam contra Ghosn acusações de violações financeiras, como declaração de renda menor do que a real.
A prisão, em 19 de novembro de 2018, ocorreu em frente a câmeras de TV quando saía do avião privado da Nissan em Tóquio. Após 108 dias preso na capital japonesa, Ghosn foi libertado em março de 2019 com fiança de R$ 33 milhões. Em abril, acabou preso novamente, em casa, sob acusação de violação. Para ser solto, pagou nova fiança, dessa vez de R$ 18 milhões, e ganhou a liberdade com uma série de restrições. O executivo nega essas acusações, alegando perseguição por parte da Justiça japonesa.
Apoio para escapar do Japão
A suspeita é de que Carlos Ghosn tenha embarcado em um jato particular no aeroporto de Kansai.
Um avião desse tipo decolou no domingo às 23h (11h em Brasília) com destino a Istambul. Segundo o jornal Financial Times, ele teria contratado uma empresa de segurança privada para ajudá-lo a passar pela vigilância policial. Junichiro Hironaka, que lidera a equipe de advogados de Ghosn no Japão, disse que o voo para o Líbano “apareceu do nada”.
De acordo com o Wall Street Journal, a fuga ocorreu depois de semanas de planejamento por parte de colaboradores que pretendiam levar o executivo para um país que acreditassem oferecer um ambiente jurídico mais favorável – a esposa de Ghosn escreveu artigos e pediu ajuda a chefes de Estado contra o que considera abusos da lei japonesa.
O executivo teria sido levado de sua residência monitorada pela Justiça em Tóquio para um jato particular, com destino à Turquia, de onde seguiu para o Líbano, onde estaria com sua esposa em uma casa da família. O executivo nega que familiares tenham participado da fuga do Japão. “Houve especulações na mídia de que minha esposa, Carole, e outros membros da minha família tiveram um papel importante na minha saída do Japão. Todas essas especulações são imprecisas e falsas”, declarou em comunicado. Também disse ter se libertado do que chamou de injustiça e perseguição política no Japão. A expectativa é de que ocorra uma entrevista nos próximos dias.
Conexão turca
As autoridades turcas prenderam sete pessoas suspeitas de ajudar Carlos Ghosn a chegar ao Líbano a partir de Istambul, após sua fuga do Japão. De acordo com a agência de notícias DHA, a polícia prendeu quatro pilotos, dois funcionários que trabalham em solo e o chefe de uma companhia aérea de voos fretados. O Ministério do Interior iniciou investigação para determinar as condições nas quais Ghosn conseguiu transitar pela capital econômica da Turquia, noticiou o canal NTV.
Por volta das 5h15min de segunda-feira (23h15min de domingo no horário de Brasília), um jato particular, com matrícula TC-TSR, procedente de Osaka, no Japão, pousou no aeroporto de Atatürk. Fechado para voos comerciais, o local é usado por aeronaves de carga e voos particulares. Depois de aterrissar, o jato foi levado para um galpão.
Por volta das 6h, neste mesmo dia, outro jato particular, um Bombardier Challenger 300 matrícula TC-RZA, decolou do mesmo aeroporto com destino a Beirute. Segundo a DHA, os investigadores apreenderam o registro das conversas entre o piloto da segunda aeronave e a torre de controle. “Destino Beirute”, disse o comandante na gravação, segundo a agência de notícias turca.
Na mira da Interpol
O Líbano recebeu um pedido de prisão da Interpol contra Carlos Ghosn. As autoridades libanesas anunciaram que o executivo entrou no país “legalmente”, com um passaporte francês e uma carteira de identidade libanesa, e descartaram procedimentos contra ele.
Enquanto isso, a polícia japonesa fez uma operação na residência dele em Tóquio. De acordo com fontes da investigação citadas pela imprensa local, o Ministério Público de Tóquio está examinando as imagens das câmeras de segurança na entrada da casa e no bairro.