Agonizando há vários dias, a lira, moeda turca, registrou uma forte desvalorização nesta sexta-feira (10), acentuada pelo anúncio da elevação de tarifas por parte dos Estados Undos sobre o aço e o alumínio turcos.
Diante da situação, o presidente Recep Tayyip Erdogan denunciou o que chamou de uma "guerra econômica".
A moeda turca, que perdeu quase metade de seu valor de face em relação ao dólar americano desde o início do ano, sofreu uma queda vertiginosa, atingindo níveis históricos. No fechamento de Wall Street, era negociada a 6,43 por dólar, uma queda de 13,7%, após ter perdido até 24% durante o dia.
Diante desse quadro, o presidente turco convocou seus concidadãos à "luta nacional", por meio da troca de suas divisas estrangeiras, para apoiar a moeda local. O apelo apenas contribuiu para acelerar a queda da lira.
Esse colapso, que empurra a Turquia na direção de uma crise monetária, acontece em meio a fortes tensões diplomáticas entre Ancara e Washington e de crescente desconfiança dos mercados em relação à equipe econômica de Erdogan.
O impacto foi sentido para além das fronteiras turcas. As ações de vários bancos europeus caíram, enquanto Wall Street abriu em queda, ilustrando o temor de um contágio da economia mundial.
A queda da lira nesta sexta "mostra que os investidores estão cada vez mais preocupados com a iminência de uma crise monetária total", afirma em nota o analista David Cheetham, da XTB.
- 'Temos Alá!' -
Há anos, a moeda turca sofre uma erosão inexorável, mas a hemorragia se agravou nos últimos dias, em consequência da grave crise diplomática com os Estados Unidos. O conflito está relacionado à prisão, na Turquia, de um pastor americano.
Esses dois aliados na Otan impuseram sanções recíprocas a autoridades dos respectivos governos. Embora essas medidas sejam, sobretudo, simbólicas, preocuparam investidores estrangeiros, dos quais a economia turca é dependente.
Ao anunciar no Twitter que autorizava a alta das taxas de importação sobre o aço e o alumínio turcos (para 50% e 20%, respectivamente), Donald Trump mencionou a queda da lira turca frente ao dólar e declarou: "Nossas relações com a Turquia não estão boas nesse momento".
Simbolicamente, pouco depois desse tuíte, a Presidência turca anunciou que Erdogan teve uma conversa por telefone com seu colega russo, Vladimir Putin, acrescentando que os dois líderes trataram, em especial, de Síria e comércio.
Na ausência do anúncio de medidas fortes, o presidente turco e seu ministro das Finanças não conseguiram impedir o naufrágio da lira ao longo do dia.
"Se você tem dólares, euros, ou ouro, debaixo do colchão, vá aos bancos para trocá-los por liras turcas. É uma luta nacional", convocou Erdogan, em discurso em Bayburt, no nordeste do país.
Durante seu pronunciamento, a moeda caiu ainda mais, expondo a insatisfação dos mercados.
Em meio ao caos, o presidente turco apontou, nesta sexta, um dedo acusador contra "um misterioso lobby das taxas de juros", sem mais detalhes.
"Se eles têm dólares, nós, nós temos nosso povo. Nós temos o direito e nós temos Alá!", declarou no discurso anterior, nesta madrugada.
- Credibilidade em jogo -
Os mercados também se preocupam com as orientações da política econômica de Erdogan, com o Banco Central turco teimando em elevar suas taxas para combater uma inflação que atingiu quase 16% em julho em ritmo anual.
Vários economistas consideram que seria necessária uma alta maciça das taxas do Banco Central para regular a inflação e apoiar a lira, mas Erdogan é fortemente hostil a essa política.
Visivelmente preocupado com enviar sinais positivos para os mercados, o novo ministro das Finanças, Berat Albayrak, genro de Erdogan, insistiu na importância - segundo ele - da independência do Banco Central turco.
Desde sua indicação ao cargo, após a reeleição de Erdogan em junho, Albayrak se esforçou - sem sucesso - para tranquilizar os mercados, que veem com maus olhos o controle crescente do presidente sobre os assuntos econômicos.
A agonia da lira turca esta semana quase não foi abordada pelos principais jornais e emissoras de televisão do país, a maioria controlada pelo governo.
* AFP