Os edifícios contemporâneos da cidade lembram uma mini-Dubai em meio à estepe asiática, onde se misturam a arquitetura moderna e passatempos tradicionais.
Uma enorme pirâmide de vidro com pombas brancas nas janelas é um monumento à paz. Uma torre de ferro em formato de casca de sorvete foi erigida em homenagem ao presidente Nursultan A. Nazarbayev, que mudou a capital do Cazaquistão para cá há 16 anos e gastou bilhões de dólares para criar uma obra de arte urbana.
A novidade mais recente é uma ópera com o interior recoberto com um opulento mármore bege e vermelho trazido da Itália, com um candelabro de vidro da Boêmia com cerca de 1,5 toneladas e um lobby com um terço do tamanho de um campo de futebol.
Entretanto, abaixo dos projetos futuristas e caros, velhas tradições das origens nômades do Cazaquistão - que segundo alguns datam dos tempos de Gengis Khan - estão voltando aos campos e estádios.
No entanto, a nostalgia não se limita aos esportes. Alguns habitantes mais velhos e que admiram a nova cidade ainda se lembram com carinho da arquitetura dos anos 1950. Naquela época, o líder soviético Nikita S. Khrushchev transformou esse local - que era conhecido como Tselinograd - no quartel general de uma campanha para melhorar a produção de grãos na União Soviética.
Nas periferias da cidade, foi realizado recentemente - em um estádio escorregadio por causa da chuva e da lama - o primeiro campeonato centro-asiático de kokpar, um antigo esporte equestre.
A capital de Nazarbayev parecia estar em outro planeta. O kokpar, conhecido como buzkashi no Afeganistão, é uma versão agressiva do polo, um jogo dos cavalheiros. Ao invés de jogarem no lombo de um cavalo com tacos de madeira e uma bola, os cavaleiros usam as próprias mãos e se inclinam para pegar uma ovelha ou uma cabra sem cabeça jogada no chão. Então, eles correm até o gol com o animal morto.
Ao invés de usarem traves, grandes caldeirões parecidos com piscinas infláveis servem como gol. Os cavaleiros marcam pontos se conseguirem colocar o animal morto dentro do caldeirão.
Em cada time jogam quatro cavaleiros com seus respectivos cavalos. Os cavalos e cavaleiros que se empurram, trombam e correm em torno do gol praticam um esporte de contato violento.
- É um pouco cruel jogar com uma ovelha morta, mas em nosso país isso é normal - afirmou Marat Baytugelov, um jogador aposentado que estava assistindo na arquibancada, enquanto o time da casa acabava com a equipe do Tadjiquistão. (Nos velhos tempos, os aldeões se sentariam no alto dos morros para terem uma vista melhor.)
- O mais difícil é chegar ao gol. É preciso ter braços fortes, muito fôlego e cavalgar muito bem. -
A carcaça do animal, acrescentou, não pode ter qualquer peso. Existe um mínimo obrigatório e cada animal deve ter ao menos 30 quilos.
O torneio centro-asiático foi organizado como um prelúdio à Expo 2017, da qual Astana será a sede. Espera-se que o kokpar seja a principal atração, ao menos para o público da Ásia Central e até mesmo para os fãs de outros lugares.
Tendo isso em vista, uma equipe da Turquia foi convidada para participar do evento no estádio e espera-se que ela volte em 2017. O empresário turco, Sinan Secer, afirmou que o kokpar ganhou popularidade na Turquia e é jogado por turcos que vivem na Grécia.
O jogo ainda precisa ganhar espaço na Europa Ocidental, afirmou, onde muitos ativistas dos direitos dos animais protestam contra o uso de animais mortos. Entretanto, o fato de o animal ser verdadeiro ou não é apenas um "detalhe", afirmou. Na verdade, muitos estão pensando na possibilidade de utilizar carcaças falsas.
No centro de Astana, longe da luta dos cavalos, um dos arquitetos fundadores da nova cidade, Serik Rustambekov, de 66 anos, afirmou que não tem interesse pelos séculos de tradição do kokpar.
Todavia, Rustambekov se sente atraído pelo período anterior à nova Astana e mantém as práticas arquitetônicas da parte velha da cidade, conhecida como Margem Direita, e que não foi afetada pelos prédios caros da Margem Esquerda.
Em 1954, Rustambekov tinha sete anos e vivia com a família em dois quartos, quando os primeiros colonos da Rússia e da Ucrânia foram enviados por Khrushchev para plantar os grãos que, de acordo com os planos de Moscou, permitiriam que o fornecimento de alimento da União Soviética chegasse aos mesmos níveis dos Estados Unidos. Na época, a população da cidade era de cerca de 100 mil, comparadas com as 700 mil pessoas de hoje, afirmou.
- Eles trouxeram vagões em trenós puxados por tratores e, em seguida, vieram as pessoas, entre as quais muitas eram jovens com suas famílias. Tudo era organizado e trazido de outro lugar. Algumas vezes traziam até os alimentos de avião - afirmou.
Prédios baixos foram construídos com painéis de concreto trazidos de trem de São Petersburgo, na Rússia, contou. Esses prédios ainda existem e são ocupados por famílias que já viviam na cidade quando Nazarbayev trouxe os funcionários públicos da antiga capital, Almaty, para viverem nos arranha-céus recém-construídos.
Muitos dos funcionários do governo não desejavam deixar a atmosfera cosmopolita de Almaty, com seus cafés em estilo vienense, calçadas europeias e ruas arborizadas.
Então, quando Rustambekov trabalhou nos planos originais para Astana no fim dos anos 1990, ele projetou uma passeio público simples, um caminho agradável que levava às margens do Rio Ishim.
- Era possível comprar flores, café ou tomar um sorvete e alugar uma bicicleta. No verão, era possível alugar esquis ou pranchas - contou.
Assim como o restante da cidade, o passeio tinha um nome grandioso, apesar de suas proporções modestas: a Galeria do Milênio. Nazarbayev, que teria aprovado os detalhes de todas as estruturas da nova Astana, inaugurou o passeio, mas após apenas cinco anos, contou Rustambekov, a simplicidade começou a perder espaço.
- O governo destruiu o passeio público e construiu um grande complexo residencial no lugar - afirmou.